1.26.2012

A aceitação do náufrago















The Descendants/ Os Descendentes conta uma história de luto em vida com cenário paradisíaco no fundo. É deste modo que começa o monólogo interior do protagonista, Matt (George Clooney): constatando que as vidas das pessoas no Hawaii são como todas as outras, e que as famílias havaianas como as outras todas. Dá-se um acidente no mar, logo no início do filme, e o corpo da mulher de Matt permanecerá num coma irreversível até que a família decida desligar as máquinas. Aquele corpo inerte de mulher é o centro de gravidade do filme de Alexander Payne, que sempre que de lá se afasta, em digressões justificadas por situações familiares ou de negócios, perde foco e intensidade dramática. Payne não se poupa a esforços para mostrar a beleza natural das ilhas e a riqueza da música local. Tantas vezes, meras distrações do essencial.
Tal como o anterior Sideways (2004), The Descendants é também um road movie, que apenas recorre ao avião quando existe mar pelo meio. Clooney é magnífico num papel que exige mais dele nos momentos de silêncio (o filme de Payne, filme de argumento, é, curiosamente, sempre melhor quando não há conversa). A impotência emocional do protagonista, que não entende porque as mulheres da sua vida, como o próprio diz, tendem a destruir-se cada qual à sua maneira, é dada por expressões de perplexidade e gestos algo desconexos de quem não encaixa os problemas que se lhe atravessam no caminho.
Mais do que mostrar como cada elemento da família representa um desconhecido para os demais, The Descendants filma homens e mulheres (ou um homem e as mulheres da vida dele) como territórios estranhos relativamente hostis entre si, que nunca se poderão entender verdadeiramente, apenas aceitar-se como são. O plano final que mostra o pai Matt ladeado por ambas as filhas no sofá, todos em frente da televisão, é menos sinónimo de uma família que se reconfigurou após o desaparecimento da mãe, que a consequência da resignação de Matt que se terá reconciliado com as diferentes naturezas das filhas e terá sido aceite no meio delas.
Assim como o desejo do náufrago é por terra firme, o destino do homem é encontrar o seu espaço entre as mulheres. Talvez por termos nascido de uma, o lugar de pertença seja do género feminino: uma ilha, uma casa, uma família, uma mulher.

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