11.30.2006

Bingo
















Kamikaze Bingo, o 44º episódio que vi de Curb Your Enthusiasm e um dos melhores de sempre. Por que raio terei então interrompido o visionamento da série desde essa altura, e já lá vão várias semanas? Preciso de rever prioridades. Preciso de rever muita coisa (na minha vida). Lembro-me agora.

11.29.2006

Mr. White








O Pedro Mexia refere-se a um dos filmes que deixou marca na minha vida.

Musa de amar













ama como se pudesses amar
a minha própria forma na forma
de outra mão, a que desejares
na forma de outra mão
ama como se pudesses amar
assim outra forma na minha
a mão abre-se e é vem
a mão abre-se e é tua
ama como se ama como se

Daniel Jonas, Kiss Mix


Apenas uma estrofe. Faz parte de Pathos - pequena antologia quase inédita de poesia contemporânea portuguesa: parte livro, parte CD, parte DVD. Apresenta A Musa ao Espelho: parte voz, parte piano, parte violino, parte violoncelo, parte acordeão. Poetas representados: Eduarda Chiote, João Luís Barreto Guimarães, Manuel António Pina, Rosa Alice Branco, Manuel António Pina, António Maria Lisboa, Outros. A Musa regressará a Lisboa - onde esta semana teve prestação memorável na Casa Fernando Pessoa - lá para o ano. Entretanto regalem-se com a caixa. De um bom gosto e de uma qualidade irrepreensíveis. A Musa vai andar por aí...

As “n” vidas de 007

Casino Royale podia ser o melhor Bond em muito anos. É de tal modo ambicioso que parece querer refundar o género. O "product placement" é, por comparação, vulgar: compare-se com The Departed para ver como a exposição do telemóvel é escancarada, vezes de mais, nesta aventura de 007. Por outro lado, alguém notou a marca dos celulares que usavam os homens de Scorsese? Mas isto é apenas um pormenor. Onde o filme Casino Royale se perde é no compromisso entre um conjunto de códigos do cinema de acção – da série Die Hard até à série Missão Impossível – que vêm descaracterizar estas aventuras de James Bond. Bond é agora herói para esmurrar, envenenar e esmurrar de novo, o rosto proletário de Daniel Craig aguenta bem as cicatrizes. Tal como John McLane (Willis) que chegou ao fim de cada assalto – no arranha-céus e no aeroporto – todo desfeito. Tal como Ethan Hunt (Cruise), este Bond atravessa a porta que separa a vida da morte, para voltar de lá pronto para o desafio seguinte. Para o espectador adulto se entreter com este tipo de liberdades cinéticas, é preciso encontrar o tom, ou o conceito, que sustentem o imparável encadeamento da acção destruidora. A lição vem pelo menos desde Buster Keaton. Esta capacidade de abstracção conseguia De Palma no M:I original. Conseguia o mestre McTiernan que tinha ainda ao dispor um daqueles argumentos que fez escola. Casino Royale é apenas reflexo baço disto tudo.

Marcha fúnebre

Assombrado e assombroso. Juventude em Marcha é de um grau de exigência altíssimo para com a capacidade de concentração do espectador. Várias vezes tombei. Várias vezes me levantei, trazido de volta pelo poder dessas imagens que me haviam lançado ao tapete. Não estou aqui a defender os filmes de Costa com base no masoquismo do espectador. No entanto considero que o cinema de Pedro Costa nunca antes foi tão depurado e difícil ao mesmo tempo. Pensem nestes termos: filmes como Juventude em Marcha (como se existissem outros objectos assim) encontram-se na fronteira de um cinema que implode nas suas secretas e infinitas narrativas, com algo que é já também do domínio, talvez, das artes plásticas, da instalação. Mas ao contrário de uma instalação, o ritual da sala escura impõe ao espectador o ritmo da sua própria fruição. A beleza é toda do filme. A impertinência toda nossa. A marcha é lenta e fúnebre porque não filma senão o fim das coisas. Aquilo que se tornou irrecuperável. Vidas. O protagonista, Ventura, assiste a tudo com uma dignidade impressionante. Ventura é um sobrevivente, corpo sem idade, imperturbável, memória ambulante.

11.28.2006

Proverbial























É de 61. Dura 25 minutos. O melhor disco que não me canso de ouvir este ano.

Merci, Mariana.

11.27.2006

Para ler depois

Biscoito fino













Tem outro sabor.

11.24.2006

Contraste




















Em sonhos talvez nunca confessados ou nos seus murmurados devaneios, o Kurt Wagner de Is a Woman aproxima-se do Paolo Conte de Reveries. Compensa escutar a diferença.

Molino rosso



















Falem-me de discos raros. Não me venham com a conversa dos discos impossíveis: a Amazon pôs fim a esses (e à nossa capacidade de economizar também). Passou a ser assim. A cada qual o Tom Waits de acordo com a sua teimosia.

11.23.2006

Margem mínima














Vi todos os jogos do Sporting na Liga dos Campeões e todos podiam ter terminado com a nossa vitória, empate ou derrota. A sequência de resultados não pode ser mais elucidativa: 1-0, 1-1, 0-1, 0-0 e ontem, 1-0. Em Munique e Milão foi clara a incapacidade do Sporting para criar situações de golo contra as melhores equipas. Jogamos com velocidade, controlamos a posse de bola a meio-campo mas não conseguimos ter ascendente lá à frente onde os nossos atacantes são ou inexperientes (Nani, Djaló), ou lentos (Alecsandro), ou toscos (Bueno), ou franzinos (Liedson). As defesas galácticas chamam-lhes um figo. Há que ser realista! O Sporting não teve de novo dinheiro este ano para ir buscar um atacante que faça a diferença - olhem novamente para a imagem de Crespo, e sem mágoa. Quando Nani a fizer, provavelmente temos de o vender. E assim será sempre muito difícil ir mais além. Sobretudo quando o sorteio de equipas também pouco ajuda... Agora, na UEFA (tenho a certeza que sim!), o Sporting tem hipótese de se libertar da margem mínima. Não estou triste. Estou, continuo a estar, muito orgulhoso da minha equipa. E muito realista também.

11.22.2006

Um cão que passa
















O que uma imagem diz é menos relevante do que o seu potencial para nos pôr a falar dela. Estas são imagens marcantes de um filme - Stalker - que não revejo há demasiado tempo. No momento da resolução deste desencontro, terei mais consciência daquilo que em mim mudou e do que se mantém inalterado. Seja como for, gosto muito destas imagens: da dignidade do animal que passa (cão nosso irmão) e da fragilidade do homem por quem este passa. Será Stalker um filme sobre a capacidade de sobreviver? A resposta fica para mais tarde.

Descansa em Gosford Park














Robert Altman (1925-2006), cineasta.

11.21.2006

Escuta



















A América tornou-se preponderante no cinema e no jazz, mas o jazz europeu é mais cinematográfico.

11.20.2006

Novecento




















No ano de 1995 gravaram-se obras-primas.

O género humano e o Manuel Germano














«Mas há mais verdades que mentiras nas páginas desta antologia de auto-retratos [Innocent When You Dream, Orion Books]. Há verdades, mesmo carregando o peso de mitologia consciente quando confessa que "preferia ter uma garrafa à minha frente que fazer uma lobotomia frontal" (...)»

Não apresentar as tiradas de Tom Waits também no original (opção de Nuno Galopim no texto "As verdades na mentira" do muito recomendável suplemento 6ª, do DN) é de certa forma atraiçoar a mitologia do personagem, ao mesmo tempo comprometendo o prazer de quem lê. Nem todos temos a faculdade da retroversão instintiva. Não custava nada, por exemplo, colocar lá I'd rather have a bottle in front of me than a frontal lobotomy, custava?

11.17.2006

Antoinette














Antes de ser ou não cinema histórico, é de um filme que se trata. Donde, devemos avaliá-lo com critérios estritamente cinematográficos. E, em última análise, autobiográficos: a nossa história pessoal mistura-se com as histórias dos filmes que vemos. Imagens, sons, Kirsten Dunst, emoções. E depois, ou se gosta ou não se gosta. (daqui)

Os homens dominantes




















Há algo de irreal na cena passada diante dele, como se estivesse a assistir a um drama desde a geral de um teatro. Sentirá ciúmes do doutor Durkin? Este é jovem, de boa aparência e solteiro, e Bertha encosta-se mais a ele do que alguma vez fizera a Breuer. Não! Não sente nem um mínimo de ciúmes ou animosidade. Pelo contrário, sente-se amigo e próximo de Durkin. Bertha não os divide, aproxima-os numa fraternidade de agitação. (...) «A placa de bronze, o meu consultório em Viena, a casa da minha infância e agora também Bertha: todos continuam a ser o que eram; nenhum deles precisa de mim para a sua existência. Sou incidental, permutável. Não sou necessário para o drama de Bertha. Nenhum de nós o é, nem mesmo os homens dominantes. Nem eu, nem Durkin, nem aqueles ainda por vir.» (...) Pela primeira vez, compreendeu que ele e Bertha eram colegas de sofrimento. Ela também não se transformara no que era. Não escolhera o seu caminho; pelo contrário, testemunhava as mesmas cenas a repetirem-se incessantemente. (...) Nietzsche estava errado! Breuer não era vítima de Bertha. Ambos eram vítimas. (págs. 276/277)

11.14.2006

Não há direito

Para 2007: JP Simões, U-Clic, Klaxons, The Good The Bad and The Queen, Mika, John Cale

De onde ninguém sai



Costumo dizer que a ECM é a melhor editora discográfica do mundo. Digo-o há tantos anos - e já são bastantes - como os que levo de escuta do seu muito extenso catálogo. Relações privilegiadas permitiram também que sempre me mantivesse a par dos lançamentos (quase todos), e que progressivamente fizesse meu o perfil artístico que Manfred Eicher vem impondo com assinaláveis coerência e perseverança. Nas semanas mais recentes, estes têm sido os ECM que ouço por entre vária outra música: o regressado quarteto polaco de Tomasz Stanko, com Lontano, que me leva a afirmar a cada novo disco tratar-se do seu melhor de sempre (são irresistíveis as pequenas modulações destas quase canções que tantas vezes têm a riqueza estrutural de uma suite sem que se mude de tema. Stanko pega da herança do último e mais despojado Miles Davis e entrega-o à eternidade); as explorações sonoras de Stephan Micus, homem que acredito consiga tirar o som perfeito de todo e qualquer instrumento de sopro, por mais ancestral ou artesanal que este seja (e On the Wing resulta novamente da absoluta coincidência entre uma música espiritual, não menos, e emocional, nem mais); o tributo arriscadíssimo mas em grande parte conseguido de François Couturier, Anja Lechner, Jean Marc Larché e Jean Louis Matinier ao cinema de Tarkovsky (que - é a minha vez de arriscar - sairia mais potenciado nos seus atributos poéticos e metafísicos caso pudesse ter utilizado estas composições sérias, densas e reflexivas de Couturier); por último, por agora, o piano solo de Stefano Bollani, imprevisível, idiossincrático, de enorme musicalidade, que em território profusamente preenchido sabe criar a sua própria razão e espaço de existência (algures entre Prokofiev e Brian Wilson). Quem entra na ECM, não mais daqui sai. E não me referi às capas dos discos. Atentem nas capas. Tão magníficas como a música que trazem dentro.


Os discos ECM encontram-se, por exemplo, aqui.

11.13.2006

Paolo Conte em duplo














O mal que me faz pelo bem que ele sabe.

(isto não é um post sobre tabaco)

True art














Era provincianismo da minha parte vir aqui dizer que saí embasbacado do concerto do trio de Keith Jarrett. Foi perfeitto.

True faith















Seria necessário segundo milagre, (este) fora da tela, para atravessar de olhos bem despertos a sessão de Ordet na Gulbenkian. Por vezes pedimos aos filmes mais do que nos podem dar. Foi duro - foi um duro início de fim-de-semana -, mas resisti. Graças a Johannes. Graças apenas a ele.

11.09.2006

Montagem de atracções (série)

Aquilo que em determinada fase nos atrai (ou não), define-nos.

Montagem de atracções (3)

Montagem de atracções (2)

Montagem de atracções (1)

11.08.2006

Art Buchwald (1925-200?)














"the beauty of not dying, but expecting to, is that it gives you a chance to say goodbye to everybody."

"the big question about death is not where we going, but what we were doing here in the first place."

A história. O livro.

Feitiço por inteiro
















Foi arrasador. Lura deu a ver como se canta com o corpo todo. Conquistou a sala do Tivoli, lotada, depois rendida. Vão vê-la. Ou revê-la. Lura é enorme. Muda a nossa perspectiva, comodista, do que é assistir a um concerto ao vivo. Vida é aquilo. Aquilo é a vida dela.

11.07.2006

Single















Às vezes o amor
No calendário, noutro mês, é dor,
É cego e surdo e mudo

E o dia tão diário disso tudo

11.06.2006

Are you ready to be heartbroken sessions (2)














We will grieve not, rather find/ Strength in what remains behind (Wordsworth/ Kazan)

Regresso ao bar Agito (R. da Rosa, ao Bairro Alto) na próxima sexta-feira 17 de Novembro, a partir das 22h e até às 02h, para dar música aos presentes. O prazer é todo meu!

Compreendo isso aqui

«– Está novamente a ser demasiado abstracto. Por favor, não me interprete mal, professor Nietzsche: as suas palavras são belas e poderosas, mas, quando mas lê, já não sinto que nos estejamos a relacionar pessoalmente. Apreendo o seu significado intelectual; sim, existem recompensas para a dor: o crescimento, a força, a criatividade. Compreendo isso aqui – Breuer apontou para a cabeça –, mas não entra aqui – apontou para o abdómen. – Se isso é para me ajudar, tem que me atingir onde a minha experiência está radicada. Aqui, nas entranhas, não experimento nenhum crescimento, não dou à luz nenhuma estrela dançarina! Tenho unicamente o frenesi e o caos!»

[Quando Nietzsche Chorou, Irvin D. Yalom, pág. 191]

11.03.2006

Sol da meia-noite
















Christian Fennesz, amanhã, 23h30, no cinema S. Jorge. Não é ficção; é pura realidade.

La Jetée (1962)















Raymond Bellour, no livro Entre-Images, resume assim, com enorme precisão, La Jetée, de Chris Marker:

(...) condensa, em 29 minutos: uma história de amor, uma trajectória rumo à infância, um fascínio violento pela imagem única (o único da imagem), uma representação combinada da guerra, do perigo nuclear e dos campos de concentração, uma homenagem ao cinema (Hitchcock, Langlois, Ledoux, etc.), à fotografia (Capa), uma visão da memória, uma paixão pelos museus, uma atracção pelos animais e, no meio disto tudo, um sentido agudo do instante. (pág. 170)

La Jetée encontra-se a "um piscar de olhos" de ser constituído apenas por imagens sem movimento. Mas imagens a que pelo sucessivos (re)enquadramentos, pela intencionalidade da sequênciação, pelo carácter apaixonado da música sobreposta, pelo envolvimento da voz do narrador, estamos sempre a emprestar uma impressão de movimento: que é, em última análise, da ordem das emoções. E com um investimento tal que quando esse movimento realmente acontece, somos acometidos de um sobressalto. Esclareça-se que La Jetée será, digo eu, mais para românticos obsessivos do que para amantes da ficção científica. Seja como seja, trata-se de uma das grandes obras da história do cinema que descobri apenas todo este tempo depois. Voltar à escola pode ser bom ("eles" por vezes estão cobertos de razão...)

Como me tornei homem

Quando a fotografia no bilhete de identidade mostrava uma cara de homem.

11.02.2006

Gostar de homens ©




















Luchino Visconti (n. 11.02.1906)

Evocado, aqui. Recomendação da casa: este.

Assino de cabeça para baixo

















«In some ways, Urdhva Dhanurasana (Upward Bow Pose) is the most important and fundamental backbend.»

O precipício da paixão




















Mulheres, música e whisky equivaliam-se para Vinicius de Moraes, na medida em que ajudavam a tornar mais suportável a vida. Até aqui, nada de novo, é o lugar-comum. Vinicius distinguia-se pelo modo excessivo como cultivava estas paixões: foi casado nove vezes (o homem revelou sempre uma capacidade invulgar para se enamorar, lamentando apenas não ter sido agraciado com mais uns centímetros de “pau”), escreveu e cantou a vida toda, bebeu até à cova. Tinha grande amor à vida, diziam. Tinha pânico da solidão, diziam também. Vinicius não podia parar, senão deprimia-se. Ele simplesmente procurou fazer corresponder a realidade da existência, com os horizontes ilimitados do seu imaginário de esteta. Vinicius queria a eternidade de cada instante. Desejava o absoluto de todas as emoções, e a vida é um contínuo oscilante. Teve a felicidade de conseguir fintar os pontos-mortos do destino muitas vezes. Teve uma vida cheia. Amou e foi amado. Bebeu e foi amado: o whisky, qual “cachorro engarrafado”, foi dos seus mais fiéis amigos. O documentário de Miguel Faria Jr., em exibição em duas salas de Lisboa (até quando?), tem isso tudo, a vida de Vinicius (1913-1980), muito bem arrumado. Ficamos a saber variadíssimas coisas. Se ficamos a conhecer melhor Vinicius de Moraes, já é uma outra questão. Provavelmente teríamos que baixar ao fundo da sua tristeza. Vinicius, percebe-se ainda, era um profundo melancólico (A realidade é que sem ela/ Não há paz Não há beleza/ É só tristeza e a melancolia/ Que não sai de mim/ Não sai de mim/ Não sai) disfarçado de apóstolo do hedonismo sob múltiplas formas. Na medida do possível, ficamos assim.

Gostaria de dar-te




















«Gostaria de dar-te, Namorada, aquela madrugada em que, pela primeira vez, as brancas moléculas do papel diante de mim dilataram-se ante o mistério da poesia subitamente incorporada; e dá-la com tudo o que nela havia de silencioso e inefável – o pasmo das estrelas, o mudo assombro das casas, o murmúrio místico das árvores a se tocarem sob a Lua.»

[da crónica "Poema de Aniversário", in Para Viver um Grande Amor, Crónicas e Poemas (Companhia das Letras)]

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