11.02.2006

O precipício da paixão




















Mulheres, música e whisky equivaliam-se para Vinicius de Moraes, na medida em que ajudavam a tornar mais suportável a vida. Até aqui, nada de novo, é o lugar-comum. Vinicius distinguia-se pelo modo excessivo como cultivava estas paixões: foi casado nove vezes (o homem revelou sempre uma capacidade invulgar para se enamorar, lamentando apenas não ter sido agraciado com mais uns centímetros de “pau”), escreveu e cantou a vida toda, bebeu até à cova. Tinha grande amor à vida, diziam. Tinha pânico da solidão, diziam também. Vinicius não podia parar, senão deprimia-se. Ele simplesmente procurou fazer corresponder a realidade da existência, com os horizontes ilimitados do seu imaginário de esteta. Vinicius queria a eternidade de cada instante. Desejava o absoluto de todas as emoções, e a vida é um contínuo oscilante. Teve a felicidade de conseguir fintar os pontos-mortos do destino muitas vezes. Teve uma vida cheia. Amou e foi amado. Bebeu e foi amado: o whisky, qual “cachorro engarrafado”, foi dos seus mais fiéis amigos. O documentário de Miguel Faria Jr., em exibição em duas salas de Lisboa (até quando?), tem isso tudo, a vida de Vinicius (1913-1980), muito bem arrumado. Ficamos a saber variadíssimas coisas. Se ficamos a conhecer melhor Vinicius de Moraes, já é uma outra questão. Provavelmente teríamos que baixar ao fundo da sua tristeza. Vinicius, percebe-se ainda, era um profundo melancólico (A realidade é que sem ela/ Não há paz Não há beleza/ É só tristeza e a melancolia/ Que não sai de mim/ Não sai de mim/ Não sai) disfarçado de apóstolo do hedonismo sob múltiplas formas. Na medida do possível, ficamos assim.

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