7.31.2007

Pausa


7.30.2007
















Morreu Michelangelo Antonioni.

Bergman. Herdeiros


Proponho o 5x2 do camaleónico François Ozon. Um homem, uma mulher, uma cama, uma proximidade irrecuperável entre os dois. Cruel, sim, e penso que notável também. Como diria o outro, o tempo tudo destrói. O tempo ou seremos nós?

No limiar da vida
























Um só Bergman por hoje. Aquele que gostaria de rever de imediato. O que me tocou mais fundo da primeira vez que o vi, tantos anos passados e na televisão. Nära Livet, de 1958: história(s) de três mulheres que se encontram acamadas num quarto de maternidade. Uma sofreu um desmancho, outra deseja tanto ser mãe que até medo tem da felicidade que sente e ainda outra que pensa abortar por se encontrar sozinha. Um Bergman de câmara. Mais ainda. O meu muito íntimo Bergman. O de hoje.

Bergman (1918-2007)




















Finalmente o repouso para uma mente brilhante e inquieta.

Estamos a ficar velhos
























O pedido teve de ser feito para a Margem Sul e estará a caminho.

O primeiro ano de Marian Had

















Dizem que com a chegada do lateral-esquerdo (que na foto tenta travar o espanhol Luis García) o plantel está fechado. O plantel nunca está fechado: sobretudo quando existem mais de dois milhões de euros para gastar.

7.26.2007

Discos da vida ao sabor da busca de assunto (10)



















A descoberta deste CD foi uma rara alegria, pensando eu não haver nada por explorar na música de Harold Budd depois do testamental (sublime) Avalon Sutra. The Room, que o antecede em meia dúzia de anos, funciona como regresso amadurecido, mais sereno e mais harmonioso, aos espaços sonoros que Budd trilhara com Brian Eno largos anos antes. Assemelhar-se-á, para usar da metáfora, a um manto sonoro esvoaçante que pode ser atravessado todas as vezes e por todos os lados que a sua unidade e harmonia permanecerão invioláveis. Recorda-me também a assinatura dessa superior casa de edição, que diz: "ECM, o mais belo som depois do silêncio". As composições electroacústicas de Harold Budd estão além desse credo. O silêncio sai enriquecido. A acrescentar a isto posso apenas contar o episódio do guru a quem certo dia perguntaram o que caracterizava o estado superior de consciência conhecido por samadhi. Em resposta falou o mestre zen: "O samadhi é..." e entrou em samadhi. Certas composições de Harold Budd parecem-me ilustrações da parábola.

Mais sobre Budd na Atlântico que sai amanhã para as bancas.

Discos da vida ao sabor da busca de assunto (7, 8 e 9)













Porque não concebo a música sem estes discos de David Sylvian. Não concebo o amor e não concebo a memória sem estes três discos.

Três faces de Maggie

7.25.2007

A fase Maggie
























Entrevistei Maggie Cheung na fase Irma Vep (entrevista colectiva, o que é que queriam?) que a actriz promovia em Lisboa junto do seu companheiro, o realizador Olivier Assayas. O que posso dizer é que nunca vi rosto tão belo fora do ecrã como o de Maggie Cheung. Maggie era a exotic girl next door que provavelmente todos gostaríamos do roubar ao pobre do francês. Malheureusement, Olivier divorciar-se-ia de Maggie sem recurso à nossa ajuda. Acontece aos melhores. Sucede a todos.

Maggie Cheung fotografada para o NYT por Mondino.

Cavalgando vinte anos de ondas











Há vinte anos atrás Big Wednesday, Os Três Amigos (1978) era já filme de culto entre os meus amigos que faziam surf. A impressão causada pelo visionamento do filme nessa época não terá sido significativa para mim, mas penso que aquilo que é visto na adolescência terá sempre vantagem sobre a memória futura, no sentido em que deposita mais fundo até as mais discretas emoções. Recordava assim alguns episódios de Os Três Amigos e recordava-os tal como eles se deram novamente a ver (a sequência do recrutamento militar estava particularmente fresca). Há vinte anos eu era um vulgar banhista que nunca mostrara convicção suficiente para se erguer em cima de uma longboard (desisti logo às primeiras contrariedades) e a minha cinefilia era débil demais para que percebesse aquilo que Os Três Amigos traz impresso no seu código genético: a marca elegíaca do western cruzada com o melodrama "coming of age", tipo Rebel Without a Cause, revestida com toda a mística ligada à vivência surf (que é mais do que apenas a sua prática), o culto do individualismo e da superação de obstáculos representados nos enormes vagalhos que estes "cowboys" californianos cavalgam pelos dias dentro.











John Milius terá de reconhecer a influência de John Ford neste seu filme - há inclusive a participação de Hank Worden num papel secundário, ele que fizera décadas antes o patusco Moose Harper no The Searchers, A Desaparecida. Milius é claramente sensível à transposição da aura da masculinidade para um contexto assumidamente hedonista (sea, sex and sun), que em Big Wednesday coincide com o fim da juventude e os diferentes rumos tomados pela vida dos protagonistas que são compósitos de figuras que pontuaram a adolescência do realizador e com os quais John Milius partilhou muitas ondas. Depois há também duas cenas de pancadaria filmadas de modo tão exuberante e convincente como as manobras de surf: no decorrer de uma festa particular e noutra noite de copos em zona mexicana de frequência duvidosa. Tal como nos filmes de Ford, a porradaria fortalece os laços masculinos até quando os homens ocupam lados opostos da barricada. Jack (o mais sério e responsável dos três, e o que mais depressa se reconcilia com os constrangimentos da vida adulta), Matt (o herói que tem dentro de si o seu maior antagonista, à imagem dos personagens interpretados por James Dean e da própria mitologia associada ao actor fora da tela) e Leroy (o "masoquista" que perseguirá até às derradeiras imagens a utopia da perpetuação de uma vida de grandes ondas, várias mulheres e ainda mais cerveja) são os amigos que o filme de Milius destaca, lendas das praias onde surfaram toda a vida e até ao momento em que o culto do surf se estendia já a horizontes mais vastos do que os areais vizinhos: a presença de Gerry Lopez em Big Wednesday - a integração de uma estrela mundial no universo intimista da ficção - é indício da mudança dos tempos, com novo enquadramento de uma modalidade cuja imagem idílica da ligação entre o homem e o mar foi sendo trocada pela de um desporto de competição e de marketing à escala universal.











Mas em Big Wednesday resiste ainda a toada elegíaca, a reminiscência da comunidade surfista (a outra família), a referência à figura tutelar de Bear (fabricante de pranchas e dono da mitologia daquelas ondas e dos homens que nelas surfaram), a estrutura em capítulos que se refere ao perfil do mar em cada estação e os diferentes apontamentos nostálgicos que tiram partido dos elementos naturais (por exemplo do incontornável pôr-do-sol) de modo semelhante àquele com que o western filmava os vastos espaços e os grandes canyons.

Holly
















Cole Porter, Tom Waits, Stephen Sondheim, (diz-me o que cantas...), a senhora Cole não fez a coisa por menos. Uma noite de concerto em Montreal que uma dúzia de anos depois chegou-me aos ouvidos (diz-me como cantas...). Quarenta minutos de Holly Cole é curto. Tomei nota.

7.24.2007

Virar a esquina















Depois de voltarmos na esquina dos Cole, chega-se a Lady's Bridge. Mas só a partir de 20 de Agosto.

O drama do esteta














A dada altura na espantosa série que adapta o livro de Alan Hollinghurst, A Linha de Beleza, Nick confessa a Catherine estar completamente apaixonado por Antoine por este ser muito belo. Catherine responde-lhe que não nos apaixonamos pelas pessoas pelo facto de serem belas, mas que estas tornam-se belas aos nossos olhos quando nos apaixonamos por elas. Nick é um esteta e a sua relação com o mundo dá-se através da identificação de sinais de beleza: no encontro com a arte ou no relacionamento com outros. E a vida de um esteta é sempre dramática.

A vagina enorme e as cuecas comestíveis
















Sempre preferi Curb Your Enthusiasm a Seinfeld e não há volta a dar. Muito menos quando Larry David apresenta episódios com o índice de demência deste The Ski Lift, bem próximo do final da 5ª série: a sexta época irá para o ar nos Estados Unidos em Setembro.
A coisa justifica ser relatada em detalhe. Como sempre, o desconfortável efeito cómico chega pela intersecção dos delirantes plots (intrigas) por alturas em que quase esquecemos o que ficou para trás. Neste The Ski Lift, Larry recebe novamente o investigador que ficou incumbido de descobrir se Larry foi ou não adoptado - obsessão que percorre toda a 5ª série. O investigador é chamado para outra situação e esquece-se de uma embalagem com umas cuecas comestíveis que Larry guarda no bolso do casaco que a mulher acabara de lhe oferecer para o convencer a alinhar num programa de ski com Jeff (o agente de Larry) e a mulher Susie. Entretanto Richard Lewis agoniza em casa enquanto espera por um transplante de rim. Larry é compatível com Richard mas só ajudará o amigo em último último último (e ainda assim...) caso. A enfermeira que está junto de Richard comenta com Larry que tivera em tempos um caso com Jeff que terminou rápido porque o pénis de Jeff era demasiado pequeno. Larry encontra-se com Jeff no quarto do hospital onde um primo de Richard se mantém em coma. Larry refere-se ao comentário da enfermeira acerca do tamanho do pénis de Jeff e este diz-lhe que ela é que tinha uma vagina enorme ("a huuuuuge vagina") e que isso é o fim de qualquer relação. Larry é visita frequente daquele quarto de hospital e o médico residente diz-lhe que sabe bem que ele só lá vai para se certificar da morte do paciente, para que este doe um dos rins a Richard e liberte Larry dessa responsabilidade. Quando o médico sai, Larry confessa a Jeff a sorrir que o médico topou-o bem ("He got me! He got me!"). Mais tarde Larry fica a saber que o homem responsável pela lista prioritária para receptores de rins é um judeu ortodoxo chamado Ben. Larry trata de o conhecer e finge-se tão ortodoxo quanto Ben, também fã dos Yankees e entusiasta do ski, e convida Ben para o programa de fim-de-semana na neve com o casal Jeff e... Cheryl, uma vez que Susie, que é judia, fará passar-se por mulher de Larry. Ben, viúvo, faz-se acompanhar pela filha adulta, Rachel, que é solteira. Larry tem uma trabalheira para fazer passar-se por marido de Susie, para fingir que percebe e fala yiddish, para esconder o bacon frito que a sua verdadeira mulher, Cheryl, quer levar para a mesa ao pequeno-almoço e para se mostrar aplicado a esquiar. Mas tudo corre bem dentro do possível e Ben chega a dizer a Larry que vai passar Richard para o topo da lista. Só que mais tarde pede a Larry que fique mais um pouco a esquiar com Rachel, que ele não aguenta mais. Quando Larry entra com a rapariga no elevador que os levará ao topo da pista, este tem uma avaria e fica imobilizado. A altura é significativa e o dia está a chegar ao fim. Rachel diz a Larry que não pode ser vista na companhia dele depois do pôr-do-sol: regra kosher. Os minutos passam e os dois começam a sentir frio e fome. Larry leva a mão ao bolso do casaco e descobre a embalagem das tais cuecas comestíveis. A rapariga fica repugnada quando Larry pergunta se ela quer um pedaço. Larry come as cuecas sozinho. Rachel insiste para que ele salte do elevador pois o tempo está a esgotar-se. Larry recusa e é Rachel quem - depois de lhe dar a guardar o seu telemóvel - se atira dali abaixo. Larry usa o telemóvel de Rachel para comunicar a Richard que ele não está mais no topo da lista. Em seguida pergunta-lhe se não terá deixado esquecido o seu telemóvel no quarto do amigo aquando da última visita. Desconfia que poderá ter sido a enfermeira a roubá-lo, tal como pensa que ela o terá feito com a bola de baseball assinada por Mickey Mantle que Richard guardava como troféu. Larry desconfia ainda mais de que sabe onde poderá ter escondido ela a bola e o telemóvel. Desliga e liga o seu próprio número para que Richard tente perceber se o telemóvel está no quarto. O som de chamada faz-se ouvir e parece vir do interior do corpo da enfermeira, de dentro da sua...
Isto é puro génio ou isto é puro génio?

7.23.2007

Field recordings no Tibete
























O ponto de origem nem sempre é musical. O resultado é-o invariavelmente. Doze apontamentos sonoros com complemento narrativo onde se regista o diário de Geir Jenssen - músico da área da electrónica ambiental que também responde pelo nome Biosphere -, que por alturas do ataque às torres de Nova Iorque fazia parte de um conjunto de alpinistas que se propunha atingir o topo do Cho Oyu a 8201 m. Além do equipamento de escalada, Jenssen levou também um gravador mini-disc, um microfone e um transistor. Escreveu sobre alguns momentos da aventura, fez registos sonoros (posteriormente processados em estúdio) e foi do seu grupo o único a atingir o objectivo derradeiro, na companhia de Krishna, um guia autóctone. Field Recordings from Tibet é a vários níveis fascinante, sobretudo quando se coloca sobre a ténue fronteira onde os ruídos ambiente se tornam malha sonora que é já música. Para descodificar com tempo e vagar.

Nota: é muito provável que Geir Jennsen/ Biosphere integre a programação dos Encontros de Música Experimental 2007 em Outubro próximo. Uma quase notícia em primeiríssima mão que vem a propósito.

Frase passageira

AMOR. «Um forte egoísmo é uma protecção contra a enfermidade mas, no limite, precisamos de começar a amar a fim de evitar a doença, e podemos adoecer se, em consequência de uma frustração, não conseguimos amar.» Sigmund Freud. 5.5.04

Quando o Francisco colocou esta frase no blogue (que é agora livro, Algumas Distracções, nas Quasi), ela não me servia de nada.

Feetish

















Tarantino aos pés do cinema. Nós aos pés dele. Luxuriantes caprichos.

7.20.2007

(United Nations of) Incognito

















Não foi noite memorável (tenho em conta a recta final onde demasiados clichés do acid-jazz foram despejados em tão curto espaço de tempo), embora caso houvesse um concerto destes todos os meses, eu lá estivesse todas as vezes. De preferência num espaço fechado: espécie de Paradise Garage para os aficcionados da soul. Dream on...

Discos da vida ao sabor da busca de assunto (6)












Conta-se que o baptismo discográfico de Marceneiro, o fabuloso, obrigou a que lhe vendassem os olhos para que o fadista pudesse cantar no espaço da sua imaginação, não mais constrangido pela estranheza do estúdio. Com Camané passou-se algo de semelhante. Não sendo, se quisermos ser absolutamente rigorosos, o seu primeiro disco (existe um LP gravado pelo menino Camané após ter triunfado na Grande Noite do Fado), Uma Noite de Fados foi projectado para o Camané adulto com características muito particulares. Os estúdios da Valentim de Carvalho reproduziam o ambiente de casa de fados, as mesas eram ocupadas por caras familiares, diz-se que havia vinho, caldo verde e chouriço assado e que Camané cantou como se estivesse no seu espaço natural: que há altura devia ser já o Sr. Vinho de Maria da Fé e José Luís Gordo. Uma Noite de Fados contou com direcção artística e produção de José Mário Branco, tinha os Parreiras (pai e filho) nas guitarras portuguesas e apresentava um avassalador conjunto de temas (nem me vou dar à tarefa irrelevante de destacar uns dos outros), entre o fado tradicional e a canção-fado. Sei que o fadista manifesta, e não é de hoje, algum descontentamento para com o som do disco, "magrinho", e para com o facto deste ser menos elaborado ao nível dos arranjos (aquando da edição da colectânea para a EMI internacional, Le Prince du Fado, os fados escolhidos do disco original foram registados de novo com os músicos que hoje gravam com Camané), mas eu acho - acho não, tenho a certeza! - que mais determinante que os factos é a verdade que se liberta das interpretações e uma natureza completamente genuína que não mais se veio a atingir nas gravações subsequentes, embora todas magníficas. Chamem-me retrógrado, se quiserem, mas este é mais ainda o meu Camané: é também o Camané que conheci primeiramente. Uma voz enorme despida de tudo aquilo que é acessório. Um Camané que com o repertório justo faz o que só os maiores vultos do fado fizeram antes dele: gente como Lucília do Carmo, Beatriz da Conceição, Alfredo Marceneiro e Amália. Uma coisa que se sente, que se sente na alma, difícil de explicar. Até porque um milagre, se explicado, logo deixa de o ser.

7.18.2007

Living beyond his means

























‘I think being famous has become rather common, actually. I don’t really respect the sort of people who get to be famous these days. That whole world doesn’t seem at all glamorous any more — the films aren’t glamorous, the music isn’t and the people you see getting out of the private jets aren’t. I think there is something rather tragic about it, actually.’

He admits to taking a rather ‘old-fashioned’ line on some homosexual issues, such as adoption. ‘Oh, God, I could never do that to a child. Can you imagine what it would be like having your two dads coming to school speech days? And hearing those awful queeny rows while you are trying to get to sleep?’


Everett has no boyfriend, but this is not a matter of regret. He doubts whether anyone could bear to live with him because he has become so set in his ways. One of his friends well-meaningly put his picture and his details on the homosexual dating site Gaydar. ‘I got one message from a guy who said he had seen my picture and wondered if my age was correct. I had imagined he thought I looked younger. It turned out he thought I looked older.’

He takes great comfort in a wide circle of friends, many of them extremely glamorous women. They have always been drawn to him. Not long after making Another Country, he remembers accompanying Princess Margaret to the theatre. ‘We went to see a thriller together and she said that if it got too scary, she would have to hold on to me. She called me “Leggy”. There were a lot of gins and tonics, but no, I did not have a relationship with Princess Margaret.’

He is currently writing a screenplay about the final days of Oscar Wilde and has himself in mind for the part.

Highlights da entrevista com Rupert Everett na Spectator ("no" Spectator, como diz Paulo Portas) que está cheia deles. Para depois ler na íntegra, aqui.

Discos da vida ao sabor da busca de assunto (5)











Jorge Palma - piano e voz

Neste caso, é só.

Discos da vida ao sabor da busca de assunto (4)














A dificuldade em escolher para "a vida" um único CD de Caetano Veloso é total: e o Livro? e o Circuladô? e o Estrangeiro? e o Cores, Nomes? e o Muito? e o Qualquer Coisa? e o Araçá Azul? Optei por Uns porque é escolha pouco óbvia e porque tem no meio essa deslumbrante sequência que tem Coisa Mais Linda e Você é Linda, que ouvi vezes sem conta em êxtase ou em sofrimento. Lembro-me que um dia li que Uns era disco pelo qual Caetano nutria particular carinho e que isso me fez sentir um apreciador especial da música do baiano. Caetano selou os romances da minha imaturidade com belíssimas canções que sempre preferi escutar quando o amor era apenas promessa. A música de Caetano que é tantas vezes de uma doçura desarmante, também levou a que eu falasse então com o corpo todo. Caetano é paixão que sempre espera que de novo me apaixone. Aí sim, o gosto é todo.

7.17.2007

Promessa não encomendada



















Pois fica a promessa, estimado Nuno, de escutar Kurt Elling na primeira oportunidade: falha mais imperdoável ainda se tivermos em conta que a primeira referência que dele me fizeram surgiu da boca de Paul Wertico, talvez há uns dez anos atrás, em conversa após concerto do Pat Metheny Group de que o mesmo Wertico era baterista. O Paul, como bom cidadão adepto das melhores coisas da sua Chicago, tinha já Elling debaixo de ouvido e participaria inclusive nalgumas gravações deste. Em contrapartida, pedia-te, caso não conheças já, para partires à descoberta desse outro imenso crooner, Mark Murphy que, medindo a responsabilidade de cada letra, me atrevo a considerar o Clint Eastwood do jazz vocal. Isto porque Murphy interpreta cada balada, todos os standards, como se habitasse algures entre o mundo dos vivos e a terra dos mortos. É que é mesmo tão sentido, despojado e espiritual como o descrevo. Escuta e verás.

V de voilà!















Voilà! In view, a humble vaudevillian veteran, cast vicariously as both victim and villain by the vicissitudes of Fate. This visage, no mere veneer of vanity, is a vestige of the vox populi, now vacant, vanished. However, this valorous visitation of a by-gone vexation, stands vivified and has vowed to vanquish these venal and virulent vermin vanguarding vice and vouchsafing the violently vicious and voracious violation of volition. The only verdict is vengeance; a vendetta, held as a votive, not in vain, for the value and veracity of such shall one day vindicate the vigilant and the virtuous. Verily, this vichyssoise of verbiage veers most verbose, so let me simply add that it's my very good honor to meet you and you may call me V.

É a dicção perfeita e o tremendo panache de Hugo Weaving, sempre ocultado por detrás da máscara do herói, que resgatam esta distopia orwelliana de resto mediana para patamares de fascínio como só a língua de Shakespeare consegue atingir. Eu até reconheço um certo enfado face ao excesso de simbologia que o filme convoca, mas sempre que Weaving entra em cena quebram-se as anteriores resistências. V for Vendetta, curioso paradoxo, que visa tão desmesurado e paródico dispositivo visual, é para mim um objecto de fruição predominatemente auditiva. Voilà!

Coltrane
























O maior músico de jazz de todos os tempos desapareceu há 40 anos.

John Coltrane fotografado por Herb Snitzer, Nova Iorque, 1961.

7.16.2007

Discos da vida ao sabor da busca de assunto (3)




















Devo o encontro com o cancioneiro de Stephen Sondheim ao compêndio de 69 canções de amor deste senhor, cuja inspiração vinha, dizia ele, em grande parte, das horas passadas nos bares de hotéis de Nova Iorque a escutar clássicos da Broadway à voz e piano. Devo o meu regresso às canções de Sondheim a este musical - recomendação de um outro senhor - que é a entrada mais recente para os discos da minha vida. Ouço Company talvez há uns dois anos, sempre com paixão, sempre com o desejo de superação das minhas limitações vocais. Não sou propriamente versado na história da Broadway como o segundo senhor (a maior autoridade que conheço em tão nobre género), embora acredite que os méritos de Company - a extrema inteligência e musicalidade da escrita aliada a um conjunto de interpretações definitivas, que a edição DVD dirigida por D.A. "don't look back" Pennebaker em parte explica - se mantenham inultrapassados até hoje. Company é o musical de todos os musicais, revolucionário na sua estrutura de muito ténue intriga e na profundíssima problematização da relações dos casais e da dúvida que cada vez mais nos assalta: vale mais a pena estar sozinho ou acompanhado? Sondheim levou a inteligência da sua proposta até às derradeiras consequências, proporcionando que se opte por um desfecho conclusivo ou em aberto. E depois, sacudidas as inevitáveis mas espúrias especulações, Company apresenta sobretudo um conjunto de arrebatadoras canções (Sorry-Grateful, Ladies Who Lunch, Side By Side, Being Alive), variando constantemente o ritmo, os arranjos, as dinâmicas, as situações, o humor, num imparável saciar do nosso apetite melómano. É muito bom pensar que daqui a umas décadas, se por cá andar, não terei visto diminuir um cabelo que seja do entusiasmo que sinto pelo conjunto da obra de Sondheim (escutem-no no Collector's Sondheim, três CD's, por exemplo) e por este Company, tão universal e tão mais particular.

7.13.2007

Discos da vida ao sabor da busca de assunto (2)




















John Coltrane - saxofone tenor
Johnny Hartman - voz
McCoy Tyner - piano
Jimmy Garrison - contrabaixo
Elvin Jones - bateria


Naquele tempo, numa galáxia nada longínqua, eu continuava a ser a criança que não precisava dos outros para se distrair. Estudava saxofone (passando pelas escalas a correr porque queria era tocar) - sax alto - e encerrava-me no terraço da casa. Envergonhadamente. Para não incomodar ninguém; para que ninguém me incomodasse a mim. Punha o disco, sacava as notas por aproximação e ia pelas canções dentro. Era um misto de Coltrane que quebrava a serenidade do próprio e de Johnny Hartman cheio de sentimentos para partilhar sem saber com quem. Continuo assim (o sax vendido há muito): crítico solitário do meu espectáculo. Envergonhado. A celebrar triunfos e a recalcar o ridículo. Não precisando de escutar nunca mais esta música para sabê-la sempre de coração.

Discos da vida ao sabor da busca de assunto (1)















Jon Hassell - trompete
Ry Cooder - guitarra
Jacky Terrason - piano
Ronu Majumdar - bansuri
Rick Cox - guitarra, clarinete baixo, samples

Jamie Muhoberac - zendrum
Joachim Cooder - bateria
Rick Masterson - tambura
Rose Okada - tambura

Penso no que me terá levado até este disco - o primeiro de vários que comprei de Jon Hassell. Duas hipóteses parecem mais verosímeis. Terei descoberto o som inconfundível (a beleza do som) na música para os filmes de Wenders - The End of Violence e Million Dollar Baby - ou no Brilliant Trees de David Sylvian, que de qualquer modo escutei inúmeras vezes menos do que, por exemplo, Secrets of the Beehive. Mas é também provável que o meu encontro com Hassell se tenha dado de facto com Fascinoma. Foi pelo menos aqui que o encantamento se produziu de modo inescapável. E depois há aquela aproximação ao lirismo do cancioneiro ocidental - o "king coleano" Nature Boy, o "gilbertiano" Estate, ao exotismo harmónico e melódico do jazz (Caravan e Poinciana) e mais que tudo a uma dolência misteriosa da música tradicional indiana, presente aqui de início até final. Fascinoma é o tipico disco de fim de tarde (estimável categoria), a magic hour transformada em música que respira em repouso. Tem como que a composição de um Yogi Tea, cheio de especiarias. Passam por ali muitos sons que se enroscam preguiçosamente uns nos outros. Que se plasmam naquilo que na vida devemos fazer com calma: quase tudo! Que configuram o mood. Mesmo que seja apenas o mood para escutar o disco.

7.12.2007

Dandies


















Yoga teaches us to cure what need not be endured and endure what cannot be cured.

(B.K.S. Iyengar)

Lasse Marhaug














Lasse Marhaug é norueguês e nasceu em 1974. Músico da área da electrónica, tem nome nos créditos de para cima de 200 discos. O seu som é classificado de noise e diz quem ouviu que pode ir do ruído mais ensurdecedor ao drone mais contemplativo. Descobri Marhaug em dupla com o organista Nils Henrik Asheim, através do CD Grand Mutation para a Touch, casa de Fennesz, Oren Ambarchi, Biosphere e RafaelToral. E deu-se a coincidência de estar ontem a escutar Grand Mutation pela primeira vez e deparar-me com a referência a Marhaug num texto do Pedro Costa para a Jazz.Pt de Julho/ Agosto, a propósito do festival Perspectives na Suécia. O Pedro esteve lá e classifica a prestação de Lasse Marhaug de "assustadoramente" boa. Terá sido o noise extremado o que ele experimentou, nos antípodas de Grand Mutation onde o cruzamento da electrónica com o orgão de igreja secular atribui a este registo uma sonoridade predominantemente gótica, implosiva e intemporal. A mutações são constantes e tornam-se mais perceptíveis com audições continuadas. Nota-se a pressão crescente nas intervenções de Marhaug. O resultado por vezes origina a erupção de ruídos, embora esporádicos mas que caracterizam a produção desta música sugerindo uma câmara de magma sob a superfície da Terra. Lasse Marhaug foi mais tarde responsável pela mistura do disco onde terá podido tornar a manipular os resultados do registo directo e simultâneo dos dois elementos (orgão + electrónica), ocorrido na catedral de Oslo antes desta encerrar para restauro. Grand Mutation é disco que vale a pena explorar e que se desmultiplicará em focos de interesse quando escutado com headphones que é como idealmente o deveria ser.

7.11.2007

Linha dura
























«Caring for a tween helps to keep him fit, as does jogging several miles daily, following a spartan diet, and pumping formidable quantities of iron. "I saw him outmatch men a quarter of his age," says Ryan Phillippe, who appeared in Flags of Our Fathers. "I remember everyone was at the gym and Clint had just finished on the bench press. [Actor] Barry Pepper sidled over to see if he could lift what Clint was lifting, and he couldn't move the bar."»

Cada qual com os seus modelos, não é meu grande amigo? E ainda te hei-de ver esticar esse "corpanzil" num tapete de yôga. Isso é que era!

Planetário




















For most men, the woman's body is the most beautiful thing they will ever see.

[Maurice/ Peter O'Toole/ Venus]

7.10.2007

Deixa arder




















Alcoolismo, corrupção, tortura, vingança, sacrifício, redenção, Denzel Washington, Christopher Walken, barroquismo narrativo e visual. Como é possível que eu não tenha gostado disto da primeira vez?

7.09.2007

My dinner with Jeanne Moreau and Brian Eno














O disco tocava há alguns minutos e depois, com a entrada destas vozes, foi quase como se estivesse acompanhado. O resto é música.

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