3.08.2010

Fim-de-semana no País das Maravilhas

















Thank you. Thank you. Thank you. O Alice de Tim Burton, além de ser uma proeza visual como nunca vira, curou-me a disfunção óptica em relação ao 3-D (ou isso ou os óculos de Avatar estavam estragados). E mantive-me de queixo caído ao longo das suas quase duas horas. Não conhecia o livro e não fiquei fãã da história. Mas aquele universo parece criado de raíz para um resultado artístico e tecnológico desta perfeição, e ganhou-me vezes consecutivas nos pormenores e na incrível galeria de personagens. Um Shrek melhor que Shrek porque mais subtil e porque servido pela graça do mais belo dos idiomas: o inglês falado pelos britânicos. E com isto brindo repetidas vezes à anglicização de Tim Burton, pois claro.
Vi também O Mensageiro, na procura das qualidades discriminadas pelo texto de Vasco Câmara no último Ípsilon. Gostei, mas falta-lhe alguma ousadia narrativa (e já agora também formal), dando a impressão que Oren Moverman terá usado de demasiado autocontrolo no seu filme de estreia. As situações repetem-se, acrescentando variações, sem que fique a sensação de irmos mais fundo no adensar da alma dos dois soldados que têm por missão comunicar aos familiares a morte em combate dos camaradas. Mas é obra séria, enxuta, que não propagandeia para nenhum dos lados: os que partem para a guerra e os que ficam para trás.
Antes que a cerimónia dos Oscars tivesse início, vi ainda Into the Night (1985), de John Landis, que tem as qualidades do sonho mais ou menos realista. Landis filma uma Los Angeles cuja noite parece não ter fim, em espaços que se abrem continuamente à fantasia (estradas vazias. mansões de luxo, o aeroporto, diners, iconografia pop como a imagem de Elvis ou o corpo de Bowie). Tem o incrível Jeff Goldblum na pele de um indivíduo que sofre de insónias, que descobre que a mulher o atraiçoa. Ed é um totó igual a tantos de nós que se transforma num improvável herói inspirado pela beleza máxima de Michelle Pfeiffer, ainda mais bela do que a nossa capacidade de a recordar. Into the Night ilustra de forma igualmente despretensiosa o que a propósito do cinema de Hitchcock chamaram de MacGuffin. A intriga das esmeraldas não vale nada perto dos olhos de Michelle Pfeiffer, irresistível mulher em apuros que com a nossa empatia vamos ajudar a salvar.
E os Oscars? Como sempre decidi em favor da maratona próximo da hora. A cerimónia teve ritmo, ganhou bastante com o rigor exercido sobre a duração dos agradecimentos, teve momentos admiráveis na evocação de John Hughes, na coreografia que apresentou as bandas-sonoras nomeadas ou na rábula do filme de terror de baixo orçamento interpretada pelos anfitriões da noite: Alec Baldwin e Steve Martin. E foi porreiro testemunhar em tempo real o melão de James Cameron, que é duro relacionar com o cineasta que nos deu Terminator ou True Lies e que hoje parece um ministro da Cientologia, ao qual os colaboradores se referiam com um basbaque digno de uma criatura do planeta Pandora.

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