8.17.2009

Sobre "Tony", a primeira curta-metragem de Bruno Lourenço
















«O rapaz veste-se a preceito ao espelho, num quarto de uma pensão barata. Fato, lacinho, laca no cabelo. Sobe uma das ruas inclinadas de Lisboa, ainda durante um dia, tenta entrar num bar, só que é interpelado pelo careca do porteiro: «Nome?», «Tony!», «Tony são todos. Nome?», «Jorge», «Jorge quê?», «Jorge de Matos». O primeiro filme de Bruno Lourenço está cheio de pequenos pormenores humorísticos, num cenário lisboeta e saudosista. É para rir. O autor prefere chamar-lhe um filme com apontamentos de humor. Mas, cá para nós, é uma comédia. E daquelas que fazem falta ao cinema português, de humor inteligente e cheia de bons pormenores escondidos. A personagem principal, interpretada por Tiago Fagulha, é um bagageiro de hotel, que ocupa os seus tempos livres a imitar Tony de Matos num concurso de karaoke «à antiga portuguesa». Naquele bar manhoso, encontram-se todas as velhas glórias, três Tonys, um Eduardo Nascimento, um Marco Paulo, um Carlos Paião, dois Antónios Calvário, uma Simone, duas Madalenas Iglésias. Como se adivinha, o ambiente, por si só, é propício ao humor. A ideia, sem mais nada, dá vontade de rir. Bruno Lourenço não esconde o seu encanto por um tempo ausente. «Há quem diga que o José Cid em Inglaterra seria o Elton John. O Tony de Matos, nos Estados Unidos, seria o Tony Benett», diz. Daí, o longo traveling por Lisboa, no final, ao som da sua voz, que ganha o tom de homenagem. É nessa subtil linha de fronteira que Tony se situa: entre o gozo e a devoção real, nunca percebemos ao certo onde se situa. Talvez seja um kitsch sincero. Só não me mascaro porque não tenho a roupa. Mas há elementos que o afastam de uma leitura assim tão simples. Como o extraordinário movimento de câmara no quarto da pensão. «O filme fala da solidão de uma personagem que vive através da imagem do Tony de Matos», explica. É que, ao contrário do que aparece no título da secção, este, na verdade, não é o primeiro filme de Bruno Lourenço. Quem frequenta o meio (festivais e afins) já se habituou a ver a sua gargalhada. Trabalha no cinema há longos anos. Esta é apenas a sua estreia enquanto realizador. Tem um interessante percurso enquanto director de produção e assistente de realização, em grande parte ao serviço da produtora O Som e a Fúria (foi colega de Miguel Gomes e Sandro Aguilar na escola de cinema). Quem viu Aquele Querido Mês de Agosto, de Miguel Gomes, deve mesmo lembrar-se da sua cara. Não só foi Assistente de realização (e actor, tal como toda a equipa) como baixista da banda retratada do filme. Mas faz questão de dizer: «Não há uma progressão na cadeira, há quem seja assistente de realização toda a vida, não se tornando menor por causa disso». A ideia de Tony já é antiga, o argumento foi escrito há cinco anos e partiu da imagem dos Flying Elvis. Agora finalmente concretizou-se. O filme, como acontece muitas vezes em produções de O Som e a Fúria, é feito entre amigos. Aparecem assim caras conhecidas dos bastidores do cinema, como Manuel Mozos ou o próprio João Nicolau, vencedor da competição nacional de Vila do Conde, com Canção de Amor e Saúde. A realização deste final não foi um acidente. Ou poder-se-á dizer que Bruno Lourenço tomou-lhe o gosto. Já está a escrever a próxima obra. E conta concorrer aos apoios do ICA ainda este ano. E mais não diz.»

Manuel Halpern, via Facebook.

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