12.03.2007

Promessas não cumprida(s)















Eastern Promises foi escrito por Steven Knight, argumentista do Dirty Pretty Things dirigido em 2004 por Stephen Frears, com resultados bem mais interessantes do que este novo Cronenberg. A história, diga-se em abono da verdade, também era de qualidade superior (nota-se nos diálogos, em particular, que em Eastern Promises estão cheios de frases inúteis). O cinema de Frears nada tem a ver com o de Cronenberg, pelo que é injusto confrontar os resultados de um e de outro. Podemos comparar sim Eastern Promises à restante filmografia do canadiano e verificar que existem claras marcas de autoria - a tensão homoerótica entre Kirill e Nikolai (mais brutal do que em M. Butterfly), a erotização do corpo de Viggo Mortensen (tatuado como os personagens de Crash) e os habituais apontamentos gore nas cenas de violência - mas que os resultados gerais mostram aquilo que podíamos resumir a um projecto "de encomenda", aquém da visceralidade e da radicalidade psicológica da anterior obra cronenbergiana. São pontos fracos do filme aquilo que diz respeito à personagem asséptica da enfermeira protagonizada por Naomi Watts e à familia desta; o investimento melodramático no bebé e o seu aproveitamento final; o plano da prostituta ucraniana após ter sido violentada por Nikolai a mando de Kirill, cantando baixinho em posição fetal num intento de esteticização que naquele contexto me parece despropositado; a previsibilidade no modo como irrompe a violência; alguma superficialidade na caracterização das principais figuras; por último o recurso à voz off da rapariga morta no início que se sobrepõe à leitura do seu diário efectuada pelas várias personagens. Mas existem coisas boas como a demorada luta na sauna marcada pelo instinto de sobrevivência de um corpo nu, cada vez mais ensanguentado, cada vez mais animal; e basicamente o que diz respeito à composição de Mortensen a que só modificaria o visual por vezes um pouco "matrix" de mais. Para parâmetros industriais é um filme razoavelmente interessante. Para parâmetros estabelecidos pela obra de um dos mais importantes cineastas das últimas décadas é um objecto menor. Não trazendo à colação aqueles que porventura se recordem do Funeral de Ferrara ou do Little Odessa de James Gray - que implicaria comparar um Cronenberg algo descaracterizado com exemplos de superior pujança. Quanto à questão colocada por mim num post anterior (corpo do mal ou corpo do bem?), a resposta diria mais sobre a intriga de Eastern Promises do que o que penso poder revelar a quem ainda não o viu. Fica para a próxima.

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