2.21.2007

Isn't it neurotic?
























Nunca confiar num tipo aborrecido com a vida, pois nele qualquer decisão pode não passar de um capricho. Incrível como até uma pessoa inteligente como Pauline Kael* não viu o lado sombrio de Benjamin Braddock (Dustin Hoffman), alienado até à derradeira cena, no autocarro, após ter sabotado o casamento da mulher desejada (a lindíssima Katharine Ross), os ingénuos acreditarão que por amor, os outros dirão que por obstinação. The Graduate mantém-se quarenta anos depois tão original como sempre foi. Abordagem da neurose na passagem à idade adulta, quando nos pedem que nos definamos e só queremos que nos deixem em paz. Pauline Kael diz ainda que a popularidade do filme de Mike Nichols assentou na sua proposta de fazer passar o protagonista por uma vítima do ambiente (dos adultos, melhor dizendo) que o rodeia. Quem não consegue perceber até que ponto é perversa a figura de Benjamin, apático, cruel, neurótico, agindo por esticões, devia ser condenado a rever The Graduate tantas vezes quantas forem necessárias.

Em complemento revi Dustin Hoffman, doze anos mais tarde, no seu melhor papel de sempre, em Kramer vs. Kramer. Filme igualmente muito popular à época, que é verdadeira pérola de escrita de argumento e de trabalho de actores. Do plano de abertura - sobre o rosto mais bergmaniano de todos, de entre os actores que nunca trabalharam com Bergman - com a prodigiosa Meryl Streep (que nessa altura filmava também com Woody Allen o Manhattan), ao registo dos rituais de todos os dias do pai e da criança que começam verdadeiramente a conhecer-se quando a mãe sai de casa, até às cenas de tribunal, justíssimas, que são igualmente de antologia. Kramer vs. Kramer é dos milagres aparentemente mais simples e discretos do moderno cinema americano. Ouvimos dizer que Deus está nos detalhes e o filme de Robert Benton não vive de outra coisa. Estamos sempre a vê-lo pela primeira vez.

* For Keeps (págs. 224-226)

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