7.04.2011

Auto-retrato com mulheres em volta


























Things You Can Tell Just By Looking at Her (1999) é o primeiro filme de Rodrigo García – filho do escritor Gabriel García Marquez –, de quem recentemente se estreou nas salas portuguesas Mother and Child (2009). Rodrigo García fez a mão na ficção televisiva (Sopranos, Carnivàle, Six Feet Under, In Treatment) no período que dura ainda em que as séries substituiram o cinema na capacidade de espelhar o modo como as pessoas atravessam e problematizam a sua experiência de vida (quando questionado sobre "o que é para ele um bom livro?'", António Lobo Antunes respondeu, "é aquele em que todas as páginas são espelhos onde eu me vejo tal como sou, de facto, que me ensina coisas sobre mim."; da entrevista a Ana Dias Cordeiro no Público). Os seus filmes assemelham-se bastante a um acumular de episódios teledramáticos, daí talvez a opção por dar determinada autonomia às narrativas que os constituem, antes que elas venham a interceptar-se todas entre si. Depois Rodrigo García é um realizador fascinado com o universo feminino, um cronista das solidões vividas por mulheres, que pela comparação dos filmes citados deixa perceber um conjunto de temas e funções que o interessam e que repete, após baralhar para dar de modo ligeiramente diferente.
A última história de Things You Can Tell Just By Looking at Her refere-se à vida de duas irmãs, uma detective da polícia (interpretada por Amy Brenneman, que regressará numa personagem distinta em Mother and Child), a outra, invisual, que ensina crianças com o seu problema, a ler e interpretar. Cameron Diaz (Carol), que tendemos a esquecer que é uma imensa actriz, no papel da irmã cega, tem por hábito tirar conclusões sobre os casos policiais que Kathy está a investigar. Kathy chega mesmo a dizer-lhe que mais do que detective, existe nela uma capacidade efabulatória própria de um escritor. Poder-se-ia dizer algo semelhante de Rodrigo García . Ele escolheu um meio audiovisual para se exprimir, mas no coração do seu trabalho reside um ficcionista atento aos traços de cada personagem, que olha o mundo como imensa teia narrativa à espera de que lhe unam as pontas. O facto de ser filho de quem é poderá ter influenciado Rodrigo García na busca de se afirmar num outro domínio artístico, no que as mulheres e as actrizes ficaram muito a ganhar. E no que os espectadores que gostam de mulheres ganharam na possibilidade de empatizar com elas.

Nota (para os homens em particular): clicar na imagem para ler a frase que promoveu este filme.

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