11.10.2008

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O Paulo Raposo é velho conhecido que reencontrei num festival de cinema, onde se veio a proporcionar uma conversa simpática e inesperada. Já sabia que o Paulo era músico e que dirigia o catálogo da Sirr, que aloja um conjunto de referências da música experimental que eu nunca havia testado. Ficou de me enviar discos, e passaram vários meses entretanto. Os discos chegaram, tendo-me no interregno esquecido do combinado. Acho que o Paulo, pelo contrário, deve ter-se recordado bem do nosso encontro, já que dos quatro CD's que recebi, dois pelo menos são escolhas acertadíssimas. O primeiro foi aquele que mais me impressionou. Desde logo pela embalagem, toda negra, que traz um conjunto de composições de Janek Schaefer reunidas sob a designação Alone at Last. A arte do drone próxima das discografias de William Basinski ou de Christian Fennesz, bem como field recordings, são-nos apresentadas por um conjunto de paisagens sonoras sugestivas, quer as escutemos em fundo ou nos deixemos aprisionar nas suas subtis modulações. Em certos momentos ouve-se o som samplado de uma guitarra flamenca, rara nota de exotismo de um registo de resto tão espartano quanto o invólucro onde é comercializado. A sonoridade da Touch passa também por aqui, e gostei de ver que a Sirr se coloca de par com as casas que actualmente melhor tratam a música experimental.
Também da Sirr, mandado pelo Paulo, correspondendo a idêntico perfil de apresentação sóbrio mas bonito, é o CD Three Compositions do nova-iorquino Kenneth Kirschner. O que me entusiasmou no trabalho de Janek Schaefer aplica-se a estas peças longas de Kirschner, seu absoluto contemporâneo, na medida em que são ambos nascidos - tal como eu, já agora -, no ano de 1970. Predominam sons produzidos pelo piano e percussões que o músico sampla e trata rarefazendo-os de encontro ao silêncio. A música de Kirschner não nos pede outra coisa que tempo. E mesmo concedendo-lhe atenção não constante vamo-nos dando conta das suas subtis transformações: tal como a luz do farol que não ilumina duas vezes com igual incandescência, até porque a claridade do espaço por onde se propaga não se repete.
Lembrei-me de Max Richter, não sei se mais durante a escuta de Kirschner se de Janek Schaefer. É que se tratou de um contínuo que não tratei ainda de separar. Os dois outros discos que justificam referência pertencem a René Bertholo (Um Argentino no Deserto) e ao projecto designado por Pimmon (Secret Sleeping Birds). No domínio da experimentação electroacústica, proliferam os acidentes sonoros que impõem uma audição mais activa. Gostei de ambos, embora, e até alicerçando-me na opção estética que separará as edições claras das escuras da Sirr (tratando-se das capas), a minha inclinação vá claramente para as segundas, texturas em que vigora a abstracção, e onde a sugestão de preenchimento com a memória e a imaginação do ouvinte não cessa de nos instigar.

Imagem: fotos incluídas no livrete de Alone at Last, de Janek Schaefer.

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