6.30.2009
Café triste
Foto: Christian Coigny
Sempre achei que os bailarinos são os seres mais belos do planeta. Aliás eles nem sequer são deste planeta, e um dia limitam-se a partir para lá de onde vieram.
6.29.2009
Let's talk about
O curvo e o nodoso
Miguel Esteves Cardoso, domingo, 28 de Junho de 2009
Mariann Fischer-Boel, que é a senhora que manda nas hortaliças de toda a Europa, decidiu deixar de proibir os produtos hortícolas feios. Acabou-se o regime de top models em que só a beleza e a perfeição eram admissíveis. Fischer-Boel foi muito clara: "Esta decisão marca o início de uma nova era para os pepinos curvos e as cenouras nodosas". É impossível não verter uma lágrima. Todos sabemos quanto eles e elas têm sofrido. O estigma, a chacota e o ostracismo de décadas não se esquecem facilmente. O título no PÚBLICO de ontem suspirava de alívio: Pepinos curvos e cenouras nodosas de novo à venda. A peça foi saborosamente redigida por Andreia Sanches. São 26 produtos que se livraram do jugo da perfeição, mas, como seria de esperar, são os pepinos curvos, as cenouras nodosas e as beringelas tortas que recebem maior proeminência. Todos sabemos que a beleza da fruta e da hortaliça não tem nada a ver com a bondade. Aliás, se há uma tendência hoje é para desfear a fruta e a hortaliça de propósito: apanhando-a cedo de mais para ficar mais pequena; cobrindo-a de terra; raspando-a contra os muros e picando-lhe as folhas à laia de lagarta, para parecer mais "bio". Já estou a ver que a cenoura nodosa vai ser mais cara do que a outra. Afinal, um nódulo o que é senão um desejo de nascer ali outra cenoura? O homem cria as cenouras mas é Deus que lhe dá os nódulos, blá blá blá. Vai-nos sair cara a brincadeira.
Comiendo pera en Santo Amaro de Oeiras
A catalogação mais significativa que tenho para os discos está relacionada com memórias. Há um exemplo recente que não chega a ter uma semana. De cada vez que ouvir as covers de Cat Power ou músicas de Devendra Banhart lembrarei o jantar naquele recanto com vista para o mar, o gosto da conversa no vinho e vice-versa, a vontade sempre irrealizável de que as coisas voltassem a repetir-se exactamente daquela maneira.
6.27.2009
Fantásticos
Com um pé na terra e o outro sabe-se lá onde [vejo ali Hugo Largo e por extensão Mimi Goese, Tyrannosaurus Rex, Björk, Final Fantasy, Elvis Costello (?!) com o Brodsky 4tet, o soukos sul-africano, a kora do Mali], os Dirty Projectors fizeram um disco muito bonito: Bitte Orca. Isto é realidade. Nada mais evidente que a beleza servida em doses de absoluto.
Chico Pinheiro & Cia.
No final de 2003 eu colocava o disco de estreia de Chico Pinheiro no topo da minha lista de música brasileira. Pinheiro fez um outro disco, onde passou a cantar, além de compor e tocar guitarra (que já fazia), e os resultados ficaram aquém do anterior Meia Noite Meio Dia (MNMD). Ainda penso que MNMD é juntamente com Slow Motion Bossa Nova, de Celso Fonseca e Ronaldo Bastos, e Pérolas aos Poucos, de Zé Miguel Wisnik, dos três melhores discos de produção brasileira cujo som se encontra ancorado no classicismo de Tom Jobim e Edu Lobo, com um sentido de subtilíssima fusão que foi/é prerrogativa de João Gilberto. São todos três, clássicos contemporâneos por mérito próprio.
Vem isto a propósito da suspeita de preconceito com relação ao espectáculo da próxima segunda-feira na Aula Magna que junta Chico Pinheiro ao pianista Brad Mehldau, e às cantoras Fleurine e Luciana Alves. É óbvio que não vi esta formação ao vivo, mas é fácil concluir que se trata de um projecto de qualidade destinado a apreciadores de boa música no geral, e a todos quanto encheram os espectáculos de Ryuichi Sakamoto com o casal Morelenbaum no particular.
Chico Pinheiro é um tremendo compositor e instrumentista, e um cantor competente como há milhares no Brasil. Mehldau é um super músico que domina vários idiomas e que não caiu de pára-quedas na música brasileira (e quem pensar o contrário vai ter uma surpresa enorme). Já Luciana Alves tem um timbre adorável, é daquelas vozes que se derrete nos ouvidos, que conheço dos CD's de Pinheiro. Fleurine, desconheço de todo. Mas no caso, mesmo o que desconheço, arrisco recomendar.
6.26.2009
Da monarquia
Mookie (Spike Lee): Pino, fuck you, fuck your fuckin' pizza, and fuck Frank Sinatra.
Pino (John Turturro): Yeah? Well fuck you too, and fuck Michael Jackson.
6.24.2009
Et là-bas, quelle heure est-il?
De há uns tempos a esta parte, e uma vez que os Telefon Tel Aviv se viram tragicamente amputados de um dos seus elementos, os Junior Boys passaram a ocupar a pole position da pop electrónica hoje produzida. O novo disco, o terceiro, chama-se Begonne Dull Care, ou Caprice en Couleurs, e a capa ousa traduzir o próprio nome do projecto para Les Garçons de Premiére. Os Junior Boys continuam a apresentar o formato síntese de Blue Nile e Scritti Politti que serve na perfeição os propósitos de um som que evoca a deriva nocturna solitária. Eles são sofisticados sem recorrerem a demasiados ornamentos. Cada tema parece construído a partir de uma base fluída de sintetizador, à qual se acrescenta uma cadência electrónica, o pontual acidente processado pela via habitual, a modulação das vozes suspiradas (na prática overdubs das intervenções de Jeremy Greenspan), o todo estendido até ao tempo característico do formato remistura. Begonne Dull Care apresenta oito temas que preenchem cerca de 50 minutos de duração. A questão bilingue ao nível da impressão explica-se com o facto de os Junior Boys serem canadianos e pretenderem, imagino, seduzir nos dois lados e respectivos idiomas. Continuo a achar que o melhor disco deles é o primeiro: Last Exit. E que de então para cá não têm conseguido reproduzir os frequentes subtis arrebatamentos emocionais arrancados por esse registo de estreia (apesar de o segundo CD, So This is Goodbye, ser bastante bom também). Fenómenos que se sentem, embora a explicação possa ser demorada (e vaga). Até porque as canções funcionam sempre, apesar do lado baladeiro "afunkalhado" electro-acústico ser mesmo o mais forte dos Junior Boys.
6.23.2009
Todos ao "Family"
O filme do filipino Brillante Mendoza pode trazer à memória o cinema de Abel Ferrara ou de Tsai Ming-liang, mas Serbis/ Serviço não é nenhum Go Go Tales e muito menos outro Goodbye, Dragon Inn. Serbis é um concentrado físico e temporal que tem lugar no espaço de uma decrépita sala de cinema – o cinema Family – que exibe filmes pornográficos de produção local, habitada e explorada por uma família desunida após a descoberta de que o patriarca tinha segunda mulher e mais filhos noutro ponto da cidade. A reserva moral do filme de Mendoza está com as mães. Os homens, os rapazes sobretudo, entregam-se ao mel do ventre das raparigas e à voracidade da boca dos homossexuais que acorrem como morcegos oferecidos aos recantos escuros do Family. Não vejo necessidade de alertar para o conteúdo sexualmente explícito do filme de Brillante Mendoza. Há uma cena não mais "chocante" do que outra vista anteriormente no Fantasma de João Pedro Rodrigues – um homem que chupa outro homem – que dá acesso ao circuito globalizado do cinema dito, orgulhosamente, gay e lésbico. E há o pirilau entumescido do protagonista e actor fétiche de Mendoza, o jovem Coco Martin, que não é nada que Larry Clark não tenha explorado no mainstream de outra época. O principal mérito de Serbis é tornar vivo um edifício que é um grande décor de cinema, e que se substitui a toda a cidade e talvez mesmo a todo um país. A insalubridade do Family, que Mendoza não se cansa de documentar, é menos a fossa moral a céu aberto do que inicialmente suspeitamos. Aquelas figuras têm valores (amor, preguiça, prazer) e aspirações (sobrevivência) com que qualquer um se identifica. Estão ali para fazer negócio (toda a gente oferece algum tipo de "serviço"), mas há um sentido de dignidade que o filme não sacrifica, e que encontramos nas figuras femininas e no olhar da câmara de Brillante Mendoza. Que no final, gratuitamente, se imola.
6.22.2009
Marchar à sombra
Retiramos as coqueteries de Holly Golightly, a sua aparente ingenuidade, as ambições literárias de Paul Varjak, o sentido de comédia (à beira do caos) de Blake Edwards, o incrível gato chamado "gato", o boneco exótico de Mickey Rooney a fazer lembrar Jerry Lewis, a marca do sarcasmo que olha para as relações sociais da burguesia nova-iorquina, a deslumbrante partitura de Henry Mancini, e o enquadramento – intimista ou amplo – por sobre a mais cinematográfica de todas as cidades, o que sobra é a história de amor entre um gigolo e uma prostituta. Há clássicos que podiam ser permanentemente actualizados, se alguma coisa houvesse a acrescentar à perfeição.
6.19.2009
Levantar o estádio
De onde vem a calma daquele cara?
Ele não sabe ser melhor, viu?
Como não entende de ser valente
Ele não saber ser mais viril
Ele não sabe não, viu?
Às vezes dá como um frio
É o mundo que anda hostil
O mundo todo é hostil
De onde vem o jeito tão sem defeito
Que esse rapaz consegue fingir?
Olha esse sorriso tão indeciso
Tá se exibindo pra solidão
Não vão embora daqui
Eu sou o que vocês são
Não solta da minha mão
Não solta da minha mão
Eu não vou mudar não
Eu vou ficar são
Mesmo se for só não vou ceder
Deus vai dar aval sim
O mal vai ter fim
E no final assim calado
Eu sei que vou ser coroado rei de mim.
(Marcelo Camelo)
Ele não sabe ser melhor, viu?
Como não entende de ser valente
Ele não saber ser mais viril
Ele não sabe não, viu?
Às vezes dá como um frio
É o mundo que anda hostil
O mundo todo é hostil
De onde vem o jeito tão sem defeito
Que esse rapaz consegue fingir?
Olha esse sorriso tão indeciso
Tá se exibindo pra solidão
Não vão embora daqui
Eu sou o que vocês são
Não solta da minha mão
Não solta da minha mão
Eu não vou mudar não
Eu vou ficar são
Mesmo se for só não vou ceder
Deus vai dar aval sim
O mal vai ter fim
E no final assim calado
Eu sei que vou ser coroado rei de mim.
(Marcelo Camelo)
6.17.2009
"Carta" aberta a Aldina Duarte
Aldina,
Tens uns lindos pés. Foi a parte do filme que vi duas vezes. Achei-o cheio de humanidade. Mas não tão livre como tu que tens o lado infantil que te protege e te solta. Uma coisa é o que fica do que mostras, outra o modo como te encenas e os cenários que escolhem para ti. Quando te ouço falar (mais até do que quando cantas, estás a ver?) há uma ficção construída com aquilo que de ti expões. Comove-me o que só a conversa revela, e que passa por perceber que encaras o que sentes como uma espécie de vocação. A tua consciência, cedo desperta, levou-te a idealizar a pessoa em que te tornaste. O processo decorre ainda. O trabalho do Manel enquadra o risco dessas emoções e pensamentos que nos assaltam em tempo real. E arrisca quando te filma a meio caminho entre o Paredes visto por Serge Cohen e a Maria do Mar do Leitão de Barros. Tomara aos degraus do Palácio do Penedo serem subidos por ti. Tomara a nós que subisses descalça.
Com amizade,
Ricardo.
Gladiadores
A ideia forte do filme de Ridley Scott é a de que o homem só é verdadeiramente livre quando morre. (Passamos pela vida sem uma educação para a morte. Receamos o acontecimento em nós. Agarramo-nos demasiado à vida na expectiva de que algo de novo esteja para acontecer. Ou de que possamos viver de novo situações passadas, como se estivessem a acontecer-nos pela primeira vez. Da morte nada sabemos. Alguém regressou de lá para contar como foi? Logo a morte pode ser tudo o que quisermos que seja. Daí a liberdade: de poder ser tudo o que não fomos.)
Ensaio
A imagem corresponde, como é costume dizer-se, ao momento do jogo. O francês Maxime Medard sentenciava-o com o ensaio que resultou de erro atípico da equipa neozelandesa. Foi o momento alto e baixo do dia. A partida apanhou-me desprevenido no arranque da segunda parte – tinha terminado de ver a versão longa do Gladiador –, e mesmo com a derrota dos All Blacks (22-27) reforçou a convicção de que a este nível o rugby é a melhor coisa que a televisão tem para oferecer. Nenhum jogo de futebol, por excelente que seja, se lhe compara: em velocidade, intensidade, pura raça. E sábado próximo, para os que se levantarem cedo (8h30), temos re-match entre estas duas selecções, sendo que para a Nova-Zelândia a partida volta a constituir parte da preparação para o Torneio das Três Nações, que reúne as maiores potências do desporto no mundo. A preparação da Austrália acontecerá mais tarde, cerca das 11h00, altura da transmissão também em directo do jogo que oporá os Wallabies à força italiana.
Vejam o Clint Eastwood a dar-me razão, de certa maneira.
6.16.2009
Somehow related with Bacon, 'lust', Clark and Goldin
Um exemplo do trabalho fotográfico do francês Antoine D'Agata, à atenção deste estimado camarada.
Quando me referi à investida de Agata no cinema: Aka Ana.
6.15.2009
Realizado por *
1971, Play Misty for Me, Destinos nas Trevas. Tenho. Vi. Muito bom.
1972, High Plains Drifter, O Pistoleiro do Diabo. Tenho. Vi. Bom.
1973, Breezy, Ontem ao Fim do Dia. Tenho. Vi. Bom.
1975, The Eiger Sanction, A Escalada. Tenho. Vi. Bom.
1976, The Outlaw Josey Wales, O Rebelde do Kansas. Tenho. Vi. Muito bom.
1977, The Gauntlet, Barreira de Fogo. Tenho. Vi. Bom.
1980, Bronco Billy, o Aventureiro. Tenho. Vi. Muito bom.
1982, Firefox. Tenho. Vi. Mau.
1982, Honkytonk Man, A Última Canção. Tenho. Vi. Excelente.
1983, Sudden Impact, Impacto Súbito. Tenho. Vi. Bom.
1985, Pale Rider, Justiceiro Solitário. Tenho. Vi. Muito bom.
1986, Heartbreak Ridge, O Sargento de Ferro. Tenho. Vi. Bom.
1988, Bird, Fim do Sonho. Tenho. Vi. Muito bom.
1990, White Hunter, Black Heart, Caçador Branco, Coração Negro. Tenho. Vi. Muito bom.
1990, Rookie, Um Profissional de Perigo. Tenho. Vi. Razoável.
1992, Unforgiven, Imperdoável. Tenho. Vi. Excelente.
1993, A Perfect World, Um Mundo Perfeito. Tenho. Vi. Excelente.
1995, The Bridges of Madison County, As Pontes de Madison County. Tenho. Vi. Excelente.
1997, Absolute Power, Poder Absoluto. Tenho. Vi. Excelente.
1997, Midnight in the Garden of Good and Evil, Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal. Tenho. Vi. Muito bom.
1999, True Crime, Um Crime Real. Tenho. Vi. Muito bom.
2000, Space Cowboys. Tenho. Vi. Muito bom.
2002, Blood Work, Dívida de Sangue. Tenho. Vi. Muito bom.
2003, Mystic River. Tenho. Vi. Excelente.
2004, Million Dollar Baby, Sonhos Vencidos. Tenho. Vi. Excelente.
2006, Flags of Our Fathers, As Bandeiros dos Nossos Pais. Tenho. Vi. Muito bom.
2006, Letters From Iwo Jima, Cartas de Iwo Jima. Tenho. Vi. Excelente.
2008, Changelling, A Troca. Não tenho. Vi. Bom.
2008, Gran Torino. Não tenho. Vi. Excelente.
2009, Invictus. Não tenho. Não vi.
Outros filmes com Clint Eastwood na minha colecção:
Coogan’s Bluff, A Pele do Malandro (Don Siegel, 1968), Two Mules for Sister Sara, Os Abutres Têm Fome (Don Siegel, 1970), The Beguiled, Ritual de Guerra (Don Siegel, 1971), Dirty Harry, A Fúria da Razão (Don Siegel, 1971), Joe Kidd, A Crista do Diabo (John Sturges, 1972), Magnum Force, Harry, o Detective em Acção (Ted Post, 1973), The Enforcer, Harry, o Implacável (James Fargo, 1976), Every Which Way But Loose, Um Indomável Rebelde (James Fargo, 1978), Escape From Alcatraz, Os Fugitivos de Alcatraz (Don Siegel, 1979), Any Which Way You Can, O Regresso do Rebelde (Buddy Van Horn, 1982), Tightrope, Um Agente na Corda Bamba (Richard Tuggle, 1984), The Dead Pool, Na Lista do Assassino (Buddy Van Horn, 1988), Pink Cadillac, O Cadillac Cor-de-Rosa (Buddy Van Horn, 1989), In the Line of Fire, Na Linha de Fogo (Wolfgang Petersen, 1993).
* elaborado com recurso ao livro/ catálogo Clint Eastwood: um Homem com Passado, organizado por Maria João Madeira (Cinemateca Portuguesa, Dez. 2008)
1972, High Plains Drifter, O Pistoleiro do Diabo. Tenho. Vi. Bom.
1973, Breezy, Ontem ao Fim do Dia. Tenho. Vi. Bom.
1975, The Eiger Sanction, A Escalada. Tenho. Vi. Bom.
1976, The Outlaw Josey Wales, O Rebelde do Kansas. Tenho. Vi. Muito bom.
1977, The Gauntlet, Barreira de Fogo. Tenho. Vi. Bom.
1980, Bronco Billy, o Aventureiro. Tenho. Vi. Muito bom.
1982, Firefox. Tenho. Vi. Mau.
1982, Honkytonk Man, A Última Canção. Tenho. Vi. Excelente.
1983, Sudden Impact, Impacto Súbito. Tenho. Vi. Bom.
1985, Pale Rider, Justiceiro Solitário. Tenho. Vi. Muito bom.
1986, Heartbreak Ridge, O Sargento de Ferro. Tenho. Vi. Bom.
1988, Bird, Fim do Sonho. Tenho. Vi. Muito bom.
1990, White Hunter, Black Heart, Caçador Branco, Coração Negro. Tenho. Vi. Muito bom.
1990, Rookie, Um Profissional de Perigo. Tenho. Vi. Razoável.
1992, Unforgiven, Imperdoável. Tenho. Vi. Excelente.
1993, A Perfect World, Um Mundo Perfeito. Tenho. Vi. Excelente.
1995, The Bridges of Madison County, As Pontes de Madison County. Tenho. Vi. Excelente.
1997, Absolute Power, Poder Absoluto. Tenho. Vi. Excelente.
1997, Midnight in the Garden of Good and Evil, Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal. Tenho. Vi. Muito bom.
1999, True Crime, Um Crime Real. Tenho. Vi. Muito bom.
2000, Space Cowboys. Tenho. Vi. Muito bom.
2002, Blood Work, Dívida de Sangue. Tenho. Vi. Muito bom.
2003, Mystic River. Tenho. Vi. Excelente.
2004, Million Dollar Baby, Sonhos Vencidos. Tenho. Vi. Excelente.
2006, Flags of Our Fathers, As Bandeiros dos Nossos Pais. Tenho. Vi. Muito bom.
2006, Letters From Iwo Jima, Cartas de Iwo Jima. Tenho. Vi. Excelente.
2008, Changelling, A Troca. Não tenho. Vi. Bom.
2008, Gran Torino. Não tenho. Vi. Excelente.
2009, Invictus. Não tenho. Não vi.
Outros filmes com Clint Eastwood na minha colecção:
Coogan’s Bluff, A Pele do Malandro (Don Siegel, 1968), Two Mules for Sister Sara, Os Abutres Têm Fome (Don Siegel, 1970), The Beguiled, Ritual de Guerra (Don Siegel, 1971), Dirty Harry, A Fúria da Razão (Don Siegel, 1971), Joe Kidd, A Crista do Diabo (John Sturges, 1972), Magnum Force, Harry, o Detective em Acção (Ted Post, 1973), The Enforcer, Harry, o Implacável (James Fargo, 1976), Every Which Way But Loose, Um Indomável Rebelde (James Fargo, 1978), Escape From Alcatraz, Os Fugitivos de Alcatraz (Don Siegel, 1979), Any Which Way You Can, O Regresso do Rebelde (Buddy Van Horn, 1982), Tightrope, Um Agente na Corda Bamba (Richard Tuggle, 1984), The Dead Pool, Na Lista do Assassino (Buddy Van Horn, 1988), Pink Cadillac, O Cadillac Cor-de-Rosa (Buddy Van Horn, 1989), In the Line of Fire, Na Linha de Fogo (Wolfgang Petersen, 1993).
* elaborado com recurso ao livro/ catálogo Clint Eastwood: um Homem com Passado, organizado por Maria João Madeira (Cinemateca Portuguesa, Dez. 2008)
6.12.2009
Palavra de honra
O encontro involuntário com o último filme de David Mamet, Redbelt/ Código de Honra, reforça a argumentação dos que defendem, como eu, que o grande cinema feito actualmente é cada vez mais aquele que descobrimos em nossa casa. É de todo incompreensível como este Mamet não chegou às salas portuguesas, opção resultante de lógicas de mercado equivocadas das quais acabamos por sofrer danos colaterais. Adiante.
Redbelt, que é exemplar do ponto de vista da estrutura narrativa clássica, conta a história de um instrutor de Jiu-Jitsu que no passado terá tido problemas relacionados com um episódio de Guerra nunca para nós elucidado, e que agora se limita a gerir a actividade da sua academia de artes marciais, levando uma existência tão rigorosa e discreta quanto possível. Mike (interpretado pelo britânico Chiwetel Ejiofor, que possui a qualidade dos maiores actores para quem “estar” parece ser suficiente) é casado com uma brasileira (Alice Braga) que dá sinais de saturação pelo modo como a ética do marido se reflecte nas permanentes dificuldades financeiras que enfrentam. O conflito decorre do facto de ela ser uma pessoa ambiciosa e ele não. Mas o conflito central de Redbelt é outro, e ao mesmo tempo uma generalização deste. E tratando-se de Mamet, é mais denso e nebuloso, embora este seja dos seus filmes mais “transparentes”. A intriga complica-se quando Mike se vê envolvido com uma estrela de cinema (Tim Allen) e as suas pouco recomendáveis companhias, que mantêm ligações com o universo do crime e dos combates organizados (e forjados). A “força” representada por esse tipo de gente – que já integra o cinema de David Mamet desde a sua estreia, com House of Games – é algo a que Mike não pode aplicar em rigor os seus ensinamentos; conjuntura de que não se poderá libertar a não ser pela via da confrontação.
Quando Redbelt se aproxima do momento de maior tensão dramática, na noite em que Mike é suposto combater para solucionar parte dos problemas entretanto surgidos na sua vida, ele recua na decisão. E depois há essa cena absolutamente espantosa (e sem diálogo perceptível) quando Mike se prepara para abandonar o recinto onde decorrem os combates e dá a justificação do acto (que não ouvimos, apenas observamos à distância) à advogada Laura (Emily Mortimer) sua aliada, e esta responde com uma inesperada bofetada. No instante desse “sonoro” estalo o filme de Mamet desloca-se dos parâmetros de plausibilidade da história de um homem comum para os da aventura de um herói: quem achar que não precisamos mais de heróis, está redondamente enganado. E em concreto no cinema, que sempre foi o território por excelência de onde recebemos exemplos de dignidade e decência que poderão moldar as nossas vidas. Neste aspecto o regresso de Mike para enfrentar a poderosa conspiração onde acabou envolvido, é uma cena de intensidade comparável ao final de Há Lodo no Cais/ On the Waterfront, se ainda se recordam da caminhada de Terry Malloy (Marlon Brando), sozinho e ensanguentado, para denunciar a corrupção no sindicato que controlava os estivadores de New Jersey.
Redbelt tem as raízes no cinema americano desse período, a década de 50, no cinema de cunho social de realizadores como Elia Kazan, mas convoca elementos do filme “negro” e também do filme de “samurais”, em cenário contemporâneo. E com as suas linhas de filiação faz impor a força maior do cinema, que passa aqui por uma demonstração de honra impoluta onde o fundamental da escrita mametiana, brusca e analítica, é vertido para uma planificação igualmente rigorosa e essencial.
Ou então, nas palavras de Mr. Mamet:
So here’s a guy who wants to find purity in the world, and he wants to find purity in the world, and what Emily Mortimer explains to him is: “Don’t go looking for purity in the world. If you’re interested in purity why don’t you find purity in yourself?” Right? So that he finds out that his character is his fate and that he’s given the choice not to change the world, which is the purpose of political thought, right? – that in graft –, but to change himself. And so that’s what he decides to do, so that’s the end of his hero journey.
Da entrevista filmada com o crítico norte-americano Kent Jones, num dos extras da edição portuguesa, aliás toda ela também excelente.
6.09.2009
Madrugada dia inteiro
Imaginemos o post como um sonho. Associações sucedendo-se dando a sensação de que o movimento balança à revelia do controlo. Parte-se da imagem da capa de um disco, The Doctor Came at Dawn, nunca antes escutado à hora a que investe o seu sentido. Uma madrugada quem tem por detrás as canções de Bill Callahan (Smog), nebulosas e foscas como se observadas de fora da garrafa que as encerra. Barco falso, mar falso, vidro verdadeiro a causar desvios de perspectiva. A imagem do barco e do mar traz sons que se "ouvem", e que qualquer um lhes relacionaria. Mas quantos se lembrariam de À Flor do Mar, objecto derivativo de João César Monteiro, casca de noz poética soprada pelo que de essencial tem o hedonismo da cultura latina: refeições tardias, conversas com cigarras em fundo, mulheres na flor da idade e outras que soltam pétalas que gostamos (gostávamos) de apanhar. Terroristas e fadistas, turistas e piratas, praias desertas que tomam a forma de qualquer ficção. E outro título, que mesmo não vindo de César (será) é como se viesse. Também haverá piratas em A Espada e a Rosa, garante João Nicolau. E barcos, e Algarve (talvez). Continuamos à deriva, como se não quiséssemos fazer outra coisa. Porquê fazer, quando imaginar é tão mais aliciante? Porquê fazer, a menos que seja fazer o imaginado.
6.05.2009
David Carradine (1936-2009)
O corpo encontrado sem vida num quarto de hotel em Banguecoque. Não existe morte mais cinematográfica do que esta.
Adenda de 6.06.09: causa da morte remete para O Império dos Sentidos.
Esse estranho fulgor
Não tenho dúvidas ao afirmar que Carminho é a grande voz do fado a surgir depois de Camané, e se tivermos em conta as datas de estreia em disco de cada um, passaram-se cerca de 15 anos. Já me é mais difícil concordar com os que a aproximam de Maria Teresa de Noronha, talvez empurrados por uma história familiar que de certo modo trai a pujança tímbrica de Carminho, que terá tanto de aristocrático quanto de popular. Quando a ouço cantar, e a impressão ao vivo é sempre mais vincada, a figura que vem à memória é Lucília do Carmo (mais até do que Beatriz da Conceição). Porque Carminho, apesar de muito jovem, tem a maturidade visceral que transporta para o canto de uma forma que parece intuitiva. A sua opção por gravar um disco entre amigos, contemplando um repertório que se reparte por fados "difíceis" e outros de enorme jovialidade, parece-me ganha. Há coisas que não se podem pedir nem à mais extraordinária das revelações. Terão de ser os grandes fados a fazê-la ainda maior do que é já. Carminho entrou nos discos com a aprendizagem bastante adiantada, mas eu diria notar-se aqui que domina a voz de forma um pouco auto-consciente. Sente-se o deslumbramento na facilidade do estilar, no uso do vibrato (até nos roubados), mesmo que entusiasme até quando tanto brilhantismo parece desnecessário. Carminho quis dar tudo: caramba!, o quanto tem para dar. Quando quiser dar mais, menos a menos, tornar-se-á na extraordinária figura que cresce dentro dela. É só deixar-se crescer.
P.S. Há no fado uma ilusão que gosto de preservar: a da voz que comanda a interpretação, em vez da interpretação no comando da voz. Exige uma certa intempestividade vocal, e a intuição faz o resto.
6.04.2009
Um bagaço na Terra do Fogo
O cinema é outra das artes onde nada mais há que inventar, e as surpresas surgem quando surgem por um efeito de resistência ao modelo dominante. Eu gosto do modelo dominante. E de quando em vez deixo-me levar pelo radicalismo asceta de alguns cineastas.
Serve a reflexão curtíssima para introduzir o cinema de Lisandro Alonso (na imagem), cuja obra conheço numa quarta parte, um título apenas: Liverpool (que a Cinemateca programara inicialmente para esta terça-feira, mas que acabou por passar no dia seguinte devido ao atraso na chegada da cópia). Liverpool tem uma narrativa minimal, e é um daqueles casos em que o que se vê no ecrã parece tomar um rumo imperturbado pela presença do cinema mesmo ali defronte. Há um indivíduo embarcadiço que pede para descer no porto de Ushuaia (diz-se “ussuaia”) para visitar a mãe que não vê há muito. Apanha boleia numa camioneta que transporta madeira, até uma povoação no interior. Lá chegado vemos que a mãe está praticamente moribunda, que vive com uma jovem débil mental que poderá ser a filha que o indivíduo abandonou anos antes, e que é tratada por um vizinho também idoso que caça, que pede ao homem que se vá embora porque ninguém ali quer saber do seu regresso. O homem chama-se Farrel (Juan Fernandez), dorme onde calha, e usa para se aquecer uma garrafa de bagaço que despeja nas mais variadas ocasiões, certificando-se sempre primeiro de que não há ninguém por perto. O actor que faz de Farrel é parecido com Vincent Gallo. Toda a gente foi dessa opinião. E o cinema de Lisandro Alonso também deixa notar algumas afinidades: a deambulação ébria de Otar Iosseliani junto com o burlesco hirto de Aki Kaurismäki estão lá. Parecenças que de facto se reconhecem. Assim como a proximidade para com o cinema do chinês Jia Zhangke, na ligação que Alonso estabelece com figuras que habitam cenários remotos, a partir de uma distância que confere ao filme quer o pudor, quer a empatia.
Depois existe ainda o efeito (ainda para nós) desconcertante que é olharmos um filme que abandona o protagonista a um destino que não acompanhamos, mesmo que previsível, para se ocupar da rotina dos que ficam. E a chave do título, Liverpool, que tal como o “rosebud” de Orson Welles nos é dada no derradeiro plano, através do porta-chaves deixado para trás na posse de alguém que habitando aquele universo dá a sensação de viver num outro mundo só seu. Lisandro Alonso é um simpático provocador que faz do cinema uma aventura solitária, solidária, e calorosa.
Para o amigo Manuel Mozos, nas vésperas de completar meio século de vida.
6.03.2009
Husbands
(dir-esq) Richard West, Michael Heat, Martin Tomkinson e Jeffrey Bernard, na festa de um dos casamentos de Bernard.
Jill was also unhappy sexually. 'You couldn't cuddle Jeff because he'd want to fuck you. I think he probably suffers from satyriasis. I don't really want to be screwed three times a day every bloody day and I don't want to be able not to cuddle someone without him getting a bloody hard-on.' Foolishly, considering the volatility of their relationship, they had a permissive Sixties open marriage where they each felt free to have affairs. Bernard, true to form, had an affair with his great friend Allan Hall's wife, Connie. Eventually the Halls divorced. Bernard's infidelities were so blatant that Jill once played a practical joke on him by borrowing a black, curly wig from her antique dealer friend Beverley, changing her usual style of make-up by using plenty of black eyebrow pencil, and walking into the saloon bar of the Peacock, where Bernard was drinking. 'I did a bit of fluttering at Jeffrey, who was staring at me,' she recalled, 'and he started to chat me up and I just fell about laughing. I couldn't keep a straight face. He was quite pissed off with me.'
Just the One - The Wives and Times of Jeffrey Bernard, pág. 151.
Liverpool II
Notem que o blogue serve para estas coisas. Recuperar a perspectiva de ver um filme dado (até ver... ... .. .) por perdido. Sucedeu com Liverpool, de Lisandro Alonso, que erradamente divulguei como tendo sido ontem exibido na Cinemateca. O final do dia desta terça-feira fez-se impossível. Mas o telefonema de um amigo, alertado para a minha primeira nota de entusiasmo, corrigiu o sentido do mundo. É hoje, às 21h30, e finalmente eu vou lá estar. Com o desplante de quem deixou rapidamente de deixar de dar aqui qualquer programa por garantido.
6.02.2009
[Isto]
Isto de não ser de esquerda
por Rui Ramos, publicado no I em 30 de Maio de 2009
Cresci num país "a caminho do socialismo". O governo era de esquerda, os meus pais eram de esquerda, os professores no liceu eram de esquerda, os jornais eram de esquerda, os cantores da moda eram de esquerda, os militares eram de esquerda, os bispos eram de esquerda e até os partidos ditos de "direita" também eram de esquerda (do "centro-esquerda"). Aqueles que viveram nesse Portugal de há trinta anos sabem do que falo. O ar cheirava a esquerda e parece-me que até a comida sabia a esquerda. A sabedoria, o talento e a bondade só podiam ser de esquerda. A esquerda era o bem. Ser de esquerda era estar salvo, redimido de todos os pecados, isento de todas as dúvidas, dispensado de todas as reflexões. O respeitinho era de esquerda. Num país assim, era talvez fatal que a perversidade inerente à adolescência me levasse a acreditar que nada do que me fascinava pudesse ser de esquerda. Henry James, Borges, Nabokov não eram de esquerda. Os Estados Unidos não eram de esquerda. A rapariga mais bonita do liceu também não era, aparentemente, de esquerda.
O que era não ser de esquerda?
Era ler os poemas de Fernando Pessoa sem os reduzir à "expressão da angústia de classe da burguesia". Era reconhecer que o Natal não era quando um homem quisesse ou que o mundo não pulava e avançava como bola colorida nas mãos de uma criança. Era chamar as coisas pelos nomes e perceber os limites de tudo. Era aceitar o pluralismo e a contradição como características permanentes da humanidade, e não como imperfeições para serem passadas a ferro pela planificação científica da sociedade. Não ser de esquerda era compreender que Cuba era uma ditadura, ponto final.
Onde tudo começou
Eis como fui parar à direita - um lado que, depois da revolução, era como aqueles descampados entre prédios onde brincávamos em miúdos: um espaço vago, sem organizações, sem hierarquias, sem rituais, sem dogmas, sem líderes. Foi por aí que passei a andar, anarquicamente. Se tivesse nascido noutra época, estaria eu noutro lado? Talvez. O ano passado, li um texto em que Bernard Henri-Lévy justificava as suas parcialidades políticas. Descobri, sem espanto, que as razões pelas quais ele diz que é de esquerda são precisamente as mesmas pelas quais eu digo que não sou de esquerda, ou, se preferirem, pelas quais eu estou à direita (não digo "ser de direita", porque esse é um ponto de vista da esquerda). Resumo: ele fez-se de esquerda para ser livre; eu fui para a direita pela mesma razão. Os caminhos da liberdade são muitos e misteriosos. Mas talvez só à direita se possa perceber isso.
por Rui Ramos, publicado no I em 30 de Maio de 2009
Cresci num país "a caminho do socialismo". O governo era de esquerda, os meus pais eram de esquerda, os professores no liceu eram de esquerda, os jornais eram de esquerda, os cantores da moda eram de esquerda, os militares eram de esquerda, os bispos eram de esquerda e até os partidos ditos de "direita" também eram de esquerda (do "centro-esquerda"). Aqueles que viveram nesse Portugal de há trinta anos sabem do que falo. O ar cheirava a esquerda e parece-me que até a comida sabia a esquerda. A sabedoria, o talento e a bondade só podiam ser de esquerda. A esquerda era o bem. Ser de esquerda era estar salvo, redimido de todos os pecados, isento de todas as dúvidas, dispensado de todas as reflexões. O respeitinho era de esquerda. Num país assim, era talvez fatal que a perversidade inerente à adolescência me levasse a acreditar que nada do que me fascinava pudesse ser de esquerda. Henry James, Borges, Nabokov não eram de esquerda. Os Estados Unidos não eram de esquerda. A rapariga mais bonita do liceu também não era, aparentemente, de esquerda.
O que era não ser de esquerda?
Era ler os poemas de Fernando Pessoa sem os reduzir à "expressão da angústia de classe da burguesia". Era reconhecer que o Natal não era quando um homem quisesse ou que o mundo não pulava e avançava como bola colorida nas mãos de uma criança. Era chamar as coisas pelos nomes e perceber os limites de tudo. Era aceitar o pluralismo e a contradição como características permanentes da humanidade, e não como imperfeições para serem passadas a ferro pela planificação científica da sociedade. Não ser de esquerda era compreender que Cuba era uma ditadura, ponto final.
Onde tudo começou
Eis como fui parar à direita - um lado que, depois da revolução, era como aqueles descampados entre prédios onde brincávamos em miúdos: um espaço vago, sem organizações, sem hierarquias, sem rituais, sem dogmas, sem líderes. Foi por aí que passei a andar, anarquicamente. Se tivesse nascido noutra época, estaria eu noutro lado? Talvez. O ano passado, li um texto em que Bernard Henri-Lévy justificava as suas parcialidades políticas. Descobri, sem espanto, que as razões pelas quais ele diz que é de esquerda são precisamente as mesmas pelas quais eu digo que não sou de esquerda, ou, se preferirem, pelas quais eu estou à direita (não digo "ser de direita", porque esse é um ponto de vista da esquerda). Resumo: ele fez-se de esquerda para ser livre; eu fui para a direita pela mesma razão. Os caminhos da liberdade são muitos e misteriosos. Mas talvez só à direita se possa perceber isso.
Bife do Lobo
6.01.2009
Liverpool
A história do cinema está cheia de filmes sobre homens que chegam (ou regressam) a algum lugar. O acontecimento é tão antigo quanto os Gregos. Tem obviamente espaço mitológico na cronologia do cinema também. No início de Liverpool, do argentino Lisandro Alonso, um indivíduo regressa a Ushuaia, no fim do mundo. Saber disso, ter contemplado esta imagem aquando da passagem do filme o ano passado em Cannes, e duas palavras avisadas de amigos são motivos que tornam imperdível a sessão de amanhã à noite na Cinemateca.
Tonalidades concordantes
"Coca-cola combina bem com o azul do dia de hoje", frase para preencher o silêncio, "sim", concordaste, e eu a magicar o bom que era se o que tinhas acabado de dizer, "sim", se referisse à minha pergunta e não ao comentário sobre a relação entre a coca-cola e a cor do céu, o empregado voltou, poisou no tampo da mesa duas garrafas e dois copos.
[Dlim Dlão, pág. 44]
ah, se eu aguento ouvir outro não
quem sabe um talvez ou um sim eu mereça enfim.
é que eu já sei de cor
qual o quê dos quais e poréns dos afins
pense bem
ou não pense assim!
[Paquetá, Rodrigo Amarante]
eu tenho mesmo de não me conformar
sexo heterodoxo, lapsos de desejo
quando eu vejo o céu desaba sobre nós
mucosa roxa, peito cor de rolas
eu beijo, seu texto, seu queixo, seu pêlo,
sua coxa
menina deusa urbana, neta do sol
eu sou você e os meus rivais. sou só
[Deusa Urbana, Caetano Veloso]
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