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Um estereótipo da dança ditado pelas leis do corpo. As mulheres oscilam, tombam, atiram-se para o ar ou na direção do chão, e os homens amparam, apoiam, seguram-nas para que não caiam. Mas há aqui algo mais a operar que as leis do corpo. Algo que exactamente por não ter corpo, por não ser visível, pode ser difícil de antecipar se não captarmos o que o corpo nos diz: com uma linguagem que tem tanto de belo como urgente. A beleza e a urgência feminina que deve manifestar-se antes de se tornar insuportável (para elas). E que é suposto os bailarinos suportarem nessa porção exactamente excessiva. Olhando para a imagem do meio, retirada do mesmo filme de Wenders sobre Pina Bausch, noto a justeza da pequena subversão da coreógrafa alemã. Um homem encolhido, em posição fetal, é carregado às costas. Um homem encolhido, indefeso, que não se faz valer da força física própria e que deixa que a mulher o leve para qualquer parte. Mostrando o inverso do estereótipo, Pina outra coisa não faz que dar conta da vulnerabilidade das convenções. Onde está a força e que força encontramos distribuída pelos dois lados da relação? Há ainda uma (outra) força de contenção que é aquela que podendo ser tomada por sinal de fraqueza, revela afinal a sabedoria daquele (ou daquela) que recebe o movimento do outro e lhe proporciona o espaço para que essa força se dissipe. O que o outro nos pede, em certos momentos, não é sequer que o amparemos, mas que o deixemos projectar-se sobre nós ("não me agarres; deixa-me cair sobre ti; depois levantamo-nos juntos." Que sejamos o solo que anula a queda. Claro que isto é muito mais simples se nos movimentarmos no interior das intenções coreografadas da dança. Dramático em todos os palcos.