1.29.2010

Invictus


















Volta depressa Clint, que este já está esquecido.

1.28.2010

Prisão de dentro

O aspecto talvez mais angustiante de uma série assombrosa como Oz (a avaliar pelas duas primeiras épocas, o que consegui ver até ao momento), é que nada sabemos da vida anterior das personagens com excepção daquilo que conduziu à sua condenação. O mundo lá fora é raramente aludido e fica cada vez mais distante e inacessível. Oz é como um deserto que nos engole e cedo se desfazem quaisquer fantasias sobre esse universo quase exclusivamente masculino. Os homens de Oz vivem para se evadirem sem sair de onde estão, e isso só é possível pela droga, pelo sexo (visitas conjugais, onanismo e homossexualidade) ou pela violência. É não menos angustiante pensar que os homens cá fora não têm tantas outras formas de escapismo. Como se vivessemos todos encurralados: uns cercados de betão e aço, os outros oprimidos por formalidades e compromissos. Numa prisão em espaço aberto.

1.27.2010

If we build it, (they) will come













Digamos, para abreviar, que a sala estava cheia. Havia gente de pé. Projecção imaculada em vídeo de alta definição que fez sobressair a qualidade dos filmes de Rui Xavier e de Cláudia Varejão. Se conseguíssemos que fosse sempre assim(!): uma experiência de quase cinema, com a vantagem para alguns de se poder fumar durante a sessão. A experiência de um quase cinema como era vivenciado nas suas primeiras décadas de existência. Aproximadamente.
E sobre os filmes, breves tópicos à posteriori: Superfície, de Rui Xavier, tem aquilo que todas as curtas-metragens deviam possuir. Uma ideia apenas. A criação de uma atmosfera, de uma emoção. Angústia, depois surpresa, encerrando sobre um final em aberto. Superfície remete para o carácter flutuante das nossas próprias vidas (representadas pelo náufrago e pela pequena embarcação à deriva), onde nos descobrimos umas vezes vulneráveis outras seguros, e de como a alternância entre os dois estados pode ocorrer num instante e por um capricho do destino. Que aqui tem o nome de cinema.
Um Dia Frio é um pouco mais longo, embora mantenha firme o propósito da ideia única. E suas variações. O filme de Cláudia Varejão é sobre o segredo, aquilo que de privado têm as vidas dos vários elementos que constituem uma família lisboeta. O que o espectador vê a partir do momento em que eles se separam no início do dia são situações que não partilharão uns com os outros. Um Dia Frio é um objecto formalmente muito controlado, sem que isso roube vida às suas personagens ou retire presença à cidade onde decorre a acção.
A próxima projecção da NOGO-kino está praticamente definida. Surgirão notícias muito em breve no endereço privilegiado.

1.26.2010

Smash interview


















Mats Magnusson (n. 10.07.63). Até que enfim uma presença televisiva como ninguém ousa ou sabe. É preciso carne, e é mais preciso ter generoso espírito. Um portento (sueco) de boa disposição e de ironia autodepreciativa. Bem hajas, Mats: és grande!

[não vi o jogo]

1.22.2010

Filmes escolhidos por mim


















Uma vez por mês, na Nogo, projecções DVD ou HD programadas por mim. Começa terça-feira (mais informação aqui). Apareçam!

1.21.2010

O ser e o nada


























Fernando Catatau (Cidadão Instigado)

O NADA

Abram as portas das suas casas
Deixem os ladrões entrarem
Eles vão levar tudo que puderem
E você vai ficar cansado
E também muito triste
E vai caminhar por aí
Pensando em seus próprios passos
Flutuantes
Com aquela vontade de sumir
Progressivamente
E você se vai...vai
Desaparecendo aos poucos
E depois voltando à realidade
E o nada
Daí, quando você tiver a certeza de que não possui mais nada
E que até a sua própria dor não lhe pertence mais
Talvez
Em algum momento
Você se livre desses pensamentos
E se sinta
Começando
Renascendo
Solitário
Tendo em vista
Um novo momento
Então... (cont.)


Esta semana não tenho ouvido mais nada.

There is a light that never goes

out.

Shock CorridOZ




















Tenho-me lembrado frequentes vezes de Samuel Fuller enquanto vejo freneticamente a série Oz. Fuller dizia que um filme (também no sentido da sua gestação) era como um campo de batalha, precisamente aquilo que esta produção da HBO transfere para o resultado final. No episódio que fecha a primeira época, A Game of Checkers, a tradução é então literal: ocorre um motim na ala específica, conhecida por Emerald City, onde decorre a quase totalidade da acção de Oz. Fuller imprimiu a vários filmes um estilo confrontacional, psicologicamente visceral, e no caso particular de Shock Corridor o ambiente concentracionário e o seu reflexo na tensão emocional que gera, é um possível antecessor de Oz. Mais do que em qualquer filme de prisão que eu tenha visto, Oz mantém uma constante pressão alta.

1.19.2010

Programador oferece-se II
















O que o João reuniu nenhum programador ouse separar.

1.18.2010

Inglourious basterds nordestinos




















O post esteve para se chamar "os novos barbudos". Depois, menos imaginativamente, "aquele querido mês de Agosto". Pesou a herança Tarantino, porque o que os Cidadão Instigado fazem no seu terceiro disco, Uhuuu!, é semelhante ao regurgitar psicadélico de várias correntes musicais das décadas de 70 e 80 (progressivo nordestino, rock-FM nordestino, electro-pop nordestino, power pop nordestino, MOR nordestina), e o delírio daí resultante produz efeitos concorrentes com a última obra do realizador americano: é kitsch, é foleiro, é excessivo, é de génio. A gente ainda consegue ver as influências apesar da distorção da perspectiva. O pessoal do Cidadão Instigado, barbudos nascidos no Ceará, nordeste do Brasil, que se dão com a malta dos Los Hermanos e projectos derivados, dá a impressão de terem sido raptados há um par de décadas atrás por uma nave extra-terrestre, e quando finalmente os alienígenas desistiram de lhes fazer a infrutífera lavagem ao cérebro, atiraram com eles de volta ao planeta Terra para que continuassem a fazer o seu prog-rock de baile, mas com a tecnologia do séc. XXI. Imaginem um ringue de boxe onde se defrontam as sensibilidades estéticas de Reginaldo Rossi, cantor de charme de vistas largas e óculos escuros, e Bill Conti, compositor, entre outros, da partitura pujante para a série de filmes Rocky (Balboa). Anacronismo delirante que gera contágio imediato. E ainda para mais, estes Cidadão Instigado, quando não estão a pastilhar num universo lírico, lisérgico e muito pós-moderno na sua naivité autoconsciente, dá-lhes para escrever canções de amansar o corno que puxam para dançar. Com eles o prato é rock, é electro e é completo.

Xeque-mate























Campden Hill, London, c.1950 (Bill Brandt)

Só no xadrez é que se trocam damas facilmente, normalmente com objectivos precisos. Nós separamo-nos, mas fica sempre um sentimento de posse em relação às nossas ex-namoradas. O homem não troca de dama facilmente, fica sempre no fundo com pena de a ter perdido, nunca a perde verdadeiramente.

[a partir de uma conversa com o fotógrafo António Pedro Ferreira, por Ana Sousa Dias, na Pública de ontem]

1.15.2010

Tributo


























O pensador (Auguste Rodin)





















Boogie no relax (Mário Tomé)

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OZ is the Oswald State Correctional Facility, a maximum-security prison, a cage of concrete, steel and glass that echoes with violence. This brilliant series chronicles life inside an experimental cellblock in the Oswald Maximum Security Correctional Facility: Level Four called "Emerald City".


Bom fim-de-semana.

Anjos caídos


























Na minha opinião, nem o talento nem a beleza de Benjamin Biolay sofrem contestação. Ele traz para o presente a aura de artista maldito de um Serge Gainsbourg, sendo menos brilhante que este mas compensando no invólucro com um charme mais universal. Gainsbourg era um personagem infinitamente mais rico que Biolay, que no entanto tem um magnetismo sexual de maior correspondência. Isto gera preconceitos nos que se pronunciam sobre a sua música. A obra é desequilibrada. O excesso, sempre o apelo do excesso. A megalomania onde ambos se encontram. Mesmo assim, Benjamin Biolay produz bastante menos. Os tempos actuais são propícios a uma erosão demorada, que por outro lado nos consome mais tempo. Viver consome mais tempo. E uma ausência torna-se menos notada pelo excesso de presenças. Biolay tem pelo menos três bons discos com alguns momentos notáveis em todos eles. La Superbe, um duplo-CD, é o mais recente. De cada vez que o ouço descubro novos motivos de interesse. O spleen de Biolay contém cada vez mais elementos de uma realidade mesquinha que é património da humanidade. Por mais aventuras amorosas que lhe colem à imagem, e por outras tantas conquistas que ele possa (orgulhosamente ou não) ostentar, o homem que canta em La Superbe é um indivíduo profundamente só. Um anjo caído nosso semelhante. Apenas até ver diferente porque mais belo. Mas como dizia Gainsbourg, a vantagem dos feios é que a sua fealdade dura para sempre.

1.14.2010

A última pedra























O disco anterior da American Series tinha o estranho gosto da ressurreição. Mas aquilo é tão bem feito, tratado de forma tão respeitosa, que a gente até se esquece quando está a ouvir. Cash está morto, e continuam a editar álbuns seus como se estivesse vivo. E sentimo-lo vivo nesses discos, com aquela voz que nos canta do outro lado. Como se Cash estivesse já morto em vida, e agora vá estando vivo apesar de morto. American VI: Ain’t No Grave é editado a 26 de Fevereiro, e dizem que a série termina aqui.

Umbigo de ir às lágrimas


























Stephanie Seymour. 41 anos. Divorciada.

Foto: Mario Testino.

[enquanto lia um texto de Christopher Hitchens sobre a falta de sentido de humor nas mulheres, que deixei a meio quando os olhos se curvaram sobre a bela S.S.]

Um profeta



















Profeta é aquele que anuncia uma Nova Era. Oxalá as grandes exibições de João Pereira com a camisola do Sporting (que diferença, Deus meu!) preconizem isso mesmo. Ontem chegou até a marcar. De cabeça. O delírio. Ele deliria ("terceiro jogo pelo Sporting"?). Tornando minhas as palavras do profeta, antecipo para João Pereira o destino que antes dele outro ex-benquista logrou atingir com as nossas cores. Também João Vieira Pinto rubricou a melhor fase da sua carreira ao serviço do Sporting. Penso que não sofre contestação. Outro João seguir-lhe-á o exemplo. É tão natural, não foi? A Selecção vem já a seguir.

1.13.2010

Free range























Assim bebia Zaratrusta.



























Assim fumava Zaratrusta.




















Assim cantava Zaratrusta.


Mark E. Smith (1957-APANHEI-VOS).

Um raio verde
















Em O Raio Verde (1986), que ontem vi pela primeira vez e no modo sentimental, uma mulher persiste no desejo de ter uma história de amor à sua maneira. Não a vemos exprimir o que quer, antes a resistir ao que se lhe apresenta. O filme é quase só uma situação de impasse, que ocorre durante as férias de Verão. Histórias de amor que idealizamos e que nos acontecem, são como raios verdes: impressão óptica que muito ocasionalmente se produz, quando o derradeiro firmamento da luz solar desaparece no horizonte. Momentos raros. Quase milagres. Rohmer viria a filmar outra mulher assim em Um Conto de Inverno. Maravilhas que justificam todas as estrelas.

1.12.2010

Um beijo na despedida



















Eric Rohmer (1920-2010).

Pauline à la Plage, 1983.

1.11.2010

Instintos básicos















Muitos anos que viva e muitos filmes que veja, terei sempre uma mentalidade de tipo Soylent Green.

O sítio das coisas selvagens
















Este sim.

Antes das férias do senhor Delerm



















Entre 23 de Janeiro e 18 de Julho do ano passado, Vincent Delerm andou na estrada percorrendo a França e países vizinhos com o último CD, Quinze Chansons. A digressão está agora documentada num livro de fotografias e reflexões da autoria do próprio, que traz também o DVD filmado em duas noites consecutivas no Bataclan de Paris, em datas coladas à recta final da tournée. O livro + DVD intitula-se precisamente 23 Janvier - 18 Juillet 2009, o que reforça a sua componente diarística. Felizmente Vincent Delerm continua a não levar-se a sério. Aliás, o único elemento sério das suas canções é a marca de nostalgia, que nunca antes havia passado para o palco como aqui. Delerm constrói toda a actuação em torno da ideia de pequeno espectáculo de variedades, que mistura música, teatro e surpreendentemente (ou não) bastante cinema. Abre com o vibrafone de Nicolas Mathuriau, logo após a entrada em cena dos três músicos, ocultados por retratos de corpo inteiro de actrizes do período clássico de Hollywood, recortadas em contraplacado, nos braços de galãs igualmente vestidos a rigor cujas cabeças foram trocadas por imagens de rosto dos músicos no palco: além de Delerm e Mathuriau, o extraordinário multi-instrumentista, mas primeiramente trompetista, Ibrahim Maalouf. O vibrafone substitui-se à orquestração em disco do tema Tous les acteurs s'appelent Terence, e parece citar o Midnight Sun interpretado por Lionel Hampton. Seja como for, está dado o mote do concerto que revisita por igual a discografia completa de Delerm, mostra alguns inéditos (Jamais prende des risques à Paris e Lincoln Palace, por exemplo), homenageia em modo clownesco Chaplin, Tati, Woody Allen e Truffaut, e dá a conhecer episódios narrados por Delerm, que adora subverter a aura de pessoa culta, brincando com quem apelida a sua música de "varieté française au sens snob du terme". Como escrevi no início, Vincent Delerm leva tudo no gozo excepto a nostalgia. É a nostalgia que fica em fundo neste espectáculo, nas imagens projectadas no ecrã, nas vozes gravadas que servem os interlúdios entre canções, no ambiente de cabaret reforçado pelas movimentações do cenário e pela iluminação a fazer arte pobre, e na performance teatral dos músicos, figuras de tragicomédia que se projectam até aos primeiros anos do século passado. Eles vestem as canções ao mesmo tempo que lhes despem os arranjos, e isso é muito bonito de ver. E de ler.

1.08.2010

No bullshit fuckin'powerful rock'n'motherfuckin'roll


























Aviso para disponibilizarem uma clareira simpática no Santiago Alquimista no início de Fevereiro. Não me responsabilizo quando os remos, as biqueiras 48 e os 105 quilogramas de naco do lombo começarem à saraivada por ali afora. Então se os gajos tocam o Mongoose, é que vai me'mo tud'à frente.

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Dança da desilusão II















The Road, de John Hillcoat. Hillcoat tinha dado brutal conta de si no anterior The Proposition, mas aqui espalha-se ao comprido num filme que cheira com frequência a compromisso (blame it on Oprah). Tudo o que de interesse tem este The Road está morto. É direcção artística conjugada com efeitos digitais. Presta frouxo serviço à venerada última obra de Cormac McCarthy, e sendo não-explicativo não resiste a explicar alguma coisa (daí os flashbacks postiços que parecem saídos de outro filme). Tem situações comuns ao cinema pós-apocalíptico (cadáveres, canibais, destruição massiva), só que em versão série-B endinheirada. Nada contra o capital que possibilita o primeiro impacto visual forte, que depois se arrasta até à míngua de interesse. Adivinha-se a literatura que não passou para o ecrã. Acontece muitas vezes. Desilusão para cá.

Dança da desilusão I


















Afterschool, de Antonio Campos. Um robot analisa ratos num laboratório. O robot é o realizador, e por extensão projectiva o protagonista. Os ratos são os alunos de um liceu privado mais as famílias ausentes e supõe-se que disfuncionais. Suposto filme de tese, Afterschool está cheio de enquadramentos esquisitos, planos fixos invadidos pelo fora-de-campo, e imagens dentro das imagens, numa articulação tipo cubo de Rubik. Kubrick, Haneke ou Van Sant fizeram mal a algumas pessoas, e eu devia ter sabido antecipar a ratoeira. Desilusão para lá.


[isto é um excelente texto de cinema, daqueles para abrir a pestana sobre o mesmo filme].

1.06.2010

Philip Roth. Duas emoções.

«Pendant que dehors New York s'agite, que les jeunes écrivains rêvent d'être lui et que les moins jeunes le jalousent, Roth signe son livre le plus triste et le plus désespéré, Exit le fantôme, et en fini avec son alter ego de fiction, l'écrivain Nathan Zuckerman. La maladie, la vieillesse et la mort. Et l'amertume de ne pas savoir su saisir sa vie quand elle ne demandait qu'à être vécue.
Roth, c'est l'anti-Zuckerman. Exit le fantôme n'est peut-être pas son meilleur texte, mais c'est un de ses romans le plus interéssants, les plus forts. Une leçon de vie, en négatif. Quand on lui demande ce qu'il pense de la vie qu'il a eue, il nous dit que dans l'existence, on ne maîtrise rien, tout est question de hasard ou de chance...»
[Nelly Kaprièlian, Les Inrockuptibles, 23.12.09]























«As grandes figuras do internacionalismo literário têm todo o caminho aberto: quem é que, fora dos EUA, se vai aplicar a dizer que, por exemplo, os livros de Philip Roth são desde há muito tempo bastante medíocres, se tudo está preparado para fazer de mais uma tradução de um livro seu um grande acontecimento literário?»
[António Guerreiro, Expresso, 31.12.09]




"... the ultimate don't-drop-the-soap opera"


















Terminado o visionamento integral da série The Wire (objecto que pede elogios que vão muito além dos que aqui partilhei), aguardo destino recorrente em algumas personagens criadas por David Simon e Ed Burns. Cumprirei escrupulosamente a condenação que a HBO de novo sobre mim força. Volto para junto daqueles que idealizo. Onde me sinto bem. Ao encontro do realismo excessivo que dá compensação para a realidade anémica de todos os dias (quem não precisa de sentir coisas, que dê graças por essa mesma liberdade). Há os que bebem para tornar as companhias interessantes. Eu bebo acompanhando aquilo que me interessa. O que bate de frente até de costas voltadas.

1.05.2010

Lhasa no more




















Morreu Lhasa de Sela, cantora de 37 anos. Não recordo já com precisão como a descobri, provavelmente pelo Expresso (o crítico João Lisboa é fã dos dois primeiros discos, disso me lembro). Levei o primeiro CD de Lhasa, La Llorona, na primeira viagem que fiz para a primeira edição do festival de curtas de Vila do Conde. Mostrei-o ao meu amigo Miguel Gomes que usou uma das canções no seu primeiro filme, Entretanto. Parece que Lhasa está ligada a muitas primeiras vezes, e talvez por isso a notícia da sua morte seja mais chocante ainda. Tinha uma voz abrasiva como a natureza, a que regressei no igualmente óptimo The Living Road, e no disco de Stuart Staples, Leaving Songs. Uma pena.

1.04.2010

Malte leão


























Em primeiríssima mão para os leitores da blogosfera. Christopher Hitchens fará uma conferência (sobre quê? anything goes na minha opinião) dia 18 de Fevereiro de 2010, na Casa Fernando Pessoa. Subornos engarrafados no conteúdo do seu whisky preferido, para os que quiserem chegar à fala de perto com o senhor, podem e devem ser enviados para o endereço da Coelho da Rocha. Eu lá estarei para os receber.

Programador oferece-se







Baseado em factos de bom cinema


















É verdade que vi o meu filme de prisão, e isso ter-me-ia bastado. Mas o protagonista desta obra de Jacques Audiard, Um Profeta, tem mais vidas que o "pianista" do Polanski. Em paralelo com o tom realista, no osso, que se estende até final, há em Um Profeta um trajecto exemplar que precisa de ser contado. O realizador francês deslumbra-se nalguns momentos com o seu próprio virtuosismo, e ora faz como os americanos Scorsese ou Tarantino (freezes, ralentis, legendas), ora imprime a determinadas cenas uma marca de realismo místico ou mágico, como queiramos, porventura ancorada em qualquer tradição narrativa ancestral árabe.
Malik deixa de ser o indivíduo comum e sem história, o homem que para todos os efeitos nasce ao nosso olhar quando entra na prisão, para se tornar no "escolhido" – dos presidiários corsos, do cigano que o introduz no tráfico, dos outros árabes de quem se tornará líder, do camarada que uma vez morto lhe deixará ao cuidado a mulher e o filho –, no "protegido" por alguma coisa que se nos afigura como intervenção divina. Reconheço que o defeito possa ser meu na dificuldade em fazer coabitar estas duas dimensões: o realismo extremo e as liberdades poéticas. Ou então o filme não se chamaria Um Profeta. E Malik não seria uma personagem de cinema.

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