2.25.2011

Ponto cruz -I-





















│1972






















│1985






















│1990

Narciso ao espelho





















Não consigo me livrar assim tão rápido da impressão que causei numa mulher.

Não é verdade que não se pode viver sem uma mulher.
Apenas não se pode ter vivido sem uma.

Por cada Blue Valentine que tomba há um To Live and Die in L.A. que se ergue















A capa do meu dvd de To Live and Die in L.A. tem inscrita uma frase que diz que este título corresponde à "finest hour" do senhor William Friedkin: realizador do primeiro Exorcista e do French Connection. Aposto nisto, com mais confiança porque o filme antecipa agora para mim a estilização que Michael Mann viria a tornar perfeita no Heat e no Miami Vice; Mann que curiosamente faria um ano depois, em 1986, o Manhunter protagonizado por William Petersen, que é das principais figuras de To Live and Die in L.A., o que não impede que o realizador lhe dê um fim cuja visceralidade lembra o Taxi Driver de Scorsese. (A ideia é cruzar no parágrafo as referências que importam: Friedkin, Mann, Paul Schrader e Martin Scorsese.)
To Live and To Die in L.A. não se ressente de ser produto de uma década onde tanto do que fez arte ou moda se tornou kitsch, porque é um objecto que faz gáudio em ser selvagem e gratuito. É um filme de gajo que chega a ser homoerótico. A nudez masculina é gratuita: até se vê a pilinha de Petersen em silhueta (contraluz) quando este aborda a informadora e amante com requintes de "vamos lá tratar disto" que tenho de despachar uns bad guys em seguida. As perseguições de carro, marca do realizador, arrastam-se no puro prazer cinético que junta aceleração e geometria. A direcção de fotografia de Robby Müller, para quem as portas da América se abriram com os melhores filmes de Wim Wenders, surgia como que tomada pelo espírito de Conrad L. Hall (aqueles laranjas quando o sol se põe em L.A., e os tons igualmente quentes dos interiores).
Nos anos 80 alguns mavericks que transitavam da década anterior faziam-se ainda ouvir: William Friedkin era um deles. E o mundo deles era o mundo dos homens.

2.23.2011

Dois fotógrafos que sigo



























Jo Schwab (p&b) e David Bellemere (cor).

Merde



















Um inconveniente da realidade quando comparada à ficção é de que cheira mal.

Academia do western














A primeira adaptação de True Grit tem mais de 40 anos, foi realizada por Henry Hathaway e tinha como figura preponderante John Wayne. Aqui a primeira diferença significativa criada pelo filme dos Coen, que vinca mais claramente que esta é a história de Mattie Ross, defendida pela óptima Heilee Steinfeld, que provará (outra vez) de que fibra é feita ao longo de toda a aventura. Como vi a versão de Hathaway há poucas semanas, tenho bem presentes os resultados de uma e de outra e a superioridade do True Grit dos Coen, mesmo descontando o tempo que as separa.
Sabemos que o western é território de homens e de poucas mulheres. Terra de pioneiros, daí o seu carácter mitológico. Como em todos os géneros, sofreu pequenos desvios à norma e abordagens pós-modernistas também. O True Grit original, de 1969, reforça o lado melodramático na presença da rapariga e pelo seu obstinado desejo de vingança. Shane, de George Stevens, de 1953, também confrontava o olhar de um rapazito com o mundo dos cowboys e por consequência com a presença da morte. Havia também ali uma certa perda de inocência. Logo, optando os irmãos Coen por revisitar o livro de Charles Portis anteriormente passado ao cinema – justo este western e não outro –, parece fazer crer que eles não pretendiam a matriz pura e dura, mas a declinação melodramática desta. Ainda assim um western, o mais americano de todos os géneros clássicos do cinema, algo com que muitos realizadores quiseram ombrear como que para provar que conseguiam completar a tarefa e com isso ascender à categoria de clássicos eles próprios.
Outros filmes de Joel e Ethan Coen tinham elementos do western, da sua obra inaugural, Blood Simple (1984), até ao relativamente recente No Country for Old Men (2007). Ensaios há muito continuados para fazer agora um True Grit como deve ser. E até com deliciosas violentações características do universo dos Coen, como o episódio do encontro com o enforcado que culmina num outro encontro com o estranhíssimo médico a cavalo vestido com a pele e a cabeça de um urso (existe aqui um ambiente que sugere os Coen a derraparem para o Dead Man de Jarmusch). O facto de eles não seguirem o filme de Henry Hathaway talvez explique que tenham deixado fugir a melhor ideia visual desse filme, logo no início quando o realizador mostra as crianças que brincam no baloiço para em seguida dar a imagem do enforcamento de três homens. De resto, os manos fizeram muito bem em lidar com as suas ideias. O novo True Grit tem melhores carantonhas, o cuidado particular com os diálogos falados frequentemente de modo cerrado quase incompreensível, e nas três principais figuras está deveras bem servido pela menina já referida, e pelos de novo excelentes Jeff Bridges e Matt Damon: nota-se a cada instante o gozo que lhes deu dar vida a estas personagens.
O western foi morto e a sepultar em 1992 pelo insuperável Unforgiven de Clint Eastwood. Filmes como True Grit, quando conseguidos, permitem aceder à Academia do western e não se lhes nega o mérito, mas para ficar junto dos maiores de sempre é preciso transcender o western, algo que True Grit não possibilita porque tem na sua génese vários outros elementos além do lado crespuscular e da meditação sobre a violência, no que remete para obras-primas de género (ex. O Homem que Matou Liberty Valance, Ford, 1962). True Grit é um compêndio do western que leva à distribuição de esforços e equilibrio de méritos. Bom cinema popular, combinando os aspectos mais negros com alguma galhofa para a coisa não se tornar demasiado séria, mas os Coen serão antes recordados por outros filmes seus.

2.22.2011

A um deus enfurecido


























Todo o pouco que aqui escrevi sobre os High on Fire, Kylesa, Black Tusk ou Baroness (e ainda não falei de Torche), se aplica aos Weedeater. O deus deles, seja "quem" for, cospe fogo.
O meu tipo de deus; quanto mais antigo melhor.

Fidelio/contracampo


Versículos da bola

Matías menos 10: Tivemos coração. Futebol joga-se com os pés.

2.21.2011

Fidelio


Sweet freedom


























Satanás nunca soou tão doce.

Love lace


























© Ira Chernova

Indeed.

2.18.2011

Os bons espíritos (2)



























Ouço e vejo o espírito de Birth percorrendo o interior da capa dos Agalloch. Não vos posso dar o disco a escutar, mas por favor assistam ao prólogo de um filme de génio.


2.17.2011

Teoria do second best


























Depois de se ter descoberto o melhor, qualquer abordagem ao universo do metal perde por comparação. Get Thrashed (2006), mesmo assim, impressiona pelo conjunto de depoimentos reunidos, sabendo-se que os músicos desta área (a excepção é Dave Mustaine dos Megadeth, que encontrou num certo culto da personalidade forma de rebater o episódio da sua saída dos Metallica por alturas do Kill 'Em All) são extremamente directos e objectivos. Rick Ernst, produtor, realizador e montador, opta de igual modo por uma contextualização toda ela informativa, ao contrário de Sam Dunn que filtra a história do género pela sua própria vivência de "metalhead". O que Get Thrashed sacrifica de subjectividade (um ponto de vista) compensa em esclarecimento, e nisto a tradição americana do documentarismo é imbatível. Aprende-se sempre bastante a ver repetidas vezes este tipo de objectos, afinal muito idênticos entre si. E estabelece-se até associações com o momento presente, pois sempre que os Slayer surgiam na imagem, de imediato pensava na situação clínica muito grave que vive o guitarrista da banda Jeff Hanneman (taxa de mortalidade a rondar os 20%...), substituído entretanto, espera-se que temporariamente, por Gary Holt dos Exodus, outra das principais figuras de Get Thrashed.

2.16.2011

Não confundir o Bruno Mestre com Mestre Bruno




















16 Fevereiro - Defesa Tese Mestrado "Violência e Perfeição: Um estudo sobre as utopias revolucionárias em Lenine e Hitler", Bruno Garschagen. Summa Cum Laude.

2.15.2011

Um outro dia (outra)


























© regthecat

Mind the gap



Resposta ao Eddie Cochran do João Lisboa, e uma música que também liga com o filme abaixo (descoberta por mim num documentário sobre as possíveis origens do heavy metal).

Satellite of love















Adventureland (2009) é o tipo de filme que nunca nos cansamos de ver desde que crie a ilusão de que foi vivido por nós. A acção decorre a meio da década de 80, e tem por protagonista a estrela de The Social Network, Jesse Eisenberg. Até começa como esse sobrevalorizado filme de David Fincher, com Eisenberg a receber a tampa de uma colega (na festa do fim de liceu). Logo depois, James Brennan (Eisenberg) entra de férias e quando pensa que vai viajar pela Europa, antes da partida no ano sequinte para a universidade em Nova Iorque, recebe a notícia de que o pai (extraordinária composição de Jack Gilpin, quase sem diálogos) foi despromovido e que se quiser mudar-se de Pittsburgh para continuar os estudos terá de trabalhar no Verão. E assim James vê-se colocado num parque de diversões, Adventureland, onde conhecerá duas raparigas que poderão pôr fim à sua virgindade: a boazona Lisa P., que repara nele porque James é o único que não olha para ela a salivar, e Emily/ Em (interpretada por Kristen Stewart, mais bela aqui do que na saga Twilight) a jovem que curte música pop culta (Lou Reed, Bowie, Big Star, Replacements), que se veste de maneira a que não reparem nela, e que vive uma ligação clandestina com um tipo mais velho e casado que trata da manutenção do Adventureland. Se James é ainda virgem e Em há muito deixou de o ser, ambos correm o risco de se perderem para outras relações que não aquela que os completa. São duas figuras que teimam em não ver o mais óbvio; são os próprios antagonistas do seu projecto de felicidade.
Greg Mottola filmou Adventureland após o muito bem sucedido e excelente Superbad, e optou por um filme pessoal, mesmo autobiográfico. É isso que passa para o espectador, e todas as cenas têm a marca do que é sentido porque foi experienciado: da música às festas, da rotina do parque de diversões para os que lá trabalham temporariamente, contrastando com a maior ou menor excitação de quem o visita. Isto é o que se passa em volta, porque o que é decisivo no filme de Mottola são os sentimentos e a forma como as personagens lidam com eles. O grande poder do cinema constitui-se também pela capacidade de nos fazer recentrar a atenção sobre as situações ficcionais que nos são comuns, proporcionando uma perspectiva sobre elas que não tivemos quando as vivemos. Como se os filmes oferecessem a fantasia de uma oportunidade redentora para algo que faz parte do passado. Quando tal sucede nós seguimos com eles e os filmes ficam connosco. A memória é o nosso maior tesouro. Gregg Mottola nota-se que estima a sua, porque a trata com delicadeza, humor, e um saudável tom entre o melancólico e o docemente autodepreciativo. É como que uma perda da virgindade, outra vez. Ao som de Lou Reed. Satellite of Love.
[imagens retiradas daqui]

Um outro dia


























© regthecat

2.14.2011

Estava para ser nova bela imagem de mulher despida mas saiu este par


















This adorable pair both came from pet Rescue Shelters.

Hoje quase só deu casalinhos. Scroll down.

Black supremacy




Gérard Castello Lopes (1925-2011)






















Há cerca de dez anos tive o privilégio de colaborar na produção da sua retrospectiva na Fnac do Colombo. Era um senhor, homem de outro tempo. Um homem prático também. Recordo a resistência inicial a aceder a expor em espaço situado no interior de um Centro Comercial, mas como depois o convencemos com o número de visitantes que a Fnac recebia todos os dias. A imagem corresponde a uma das fotografias de que se orgulhava em particular. A levitação da rocha. O instante em que o impossível se revela.

LeRoy Grannis (1917-2011)





















Surfar com teleobjectiva

LeRoy Grannis completou nove décadas de vida no passado mês de Agosto e só nos últimos anos arrumou a prancha em definitivo. Quando decidi preencher algumas linhas a pretexto da esplêndida edição que a Taschen organizou em torno do hobby de Grannis – o mais importante fotógrafo de surf das décadas de 60 e 70, que estenderam a todo o mundo a mitologia relacionada com este modo de vida –, a tentação primeira foi procurar uma relação entre as imagens de Grannis captadas nos melhores spots da Califórnia (San Onofre, Huntington Beach, Palos Verdes Cove) ou do Havai (Sunset Beach, Waimea Bay, Pipeline) e o filme de John Milius de 1978, Big Wednesday, com Jan-Michael Vincent, William Katt e Gary Busey. Passo a explicar: essa obra de Milius está para a arte cinematográfica (imagens de um movimento que emocionalmente tende para a suspensão, entre o nostálgico e o elegíaco) assim como as inúmeras fotos de LeRoy Grannis (imagens extáticas que produzem forte movimento interior assente no seu poder evocativo, uma vez mais entre a elegia e a nostalgia) – iniciadas em finais da década de 50 por indicação do médico que recomendou que Grannis arranjasse uma actividade relaxante nos tempos deixados livres pelo seu trabalho numa empresa de telecomunicações, para atenuar o desconforto causado por uma úlcera gástrica – estão para a documentação de uma época em que o culto do surf, do carácter individualista mas também de socialização que lhes estão associados, da relação do homem com o mar (as ondas) todo poderoso, da recordação que nos traz o cenário da praia, da ausência de responsabilidades, da eterna promessa de sol, grandes ondas para surfar, jovens bronzeadas(os) apetecíveis para namorar, da aventura de todos os dias que parecia não acabar nunca.
Nenhuma informação garante que John Milius conhecesse o trabalho de Grannis, embora isso seja provável já que este começou a ter as suas imagens publicadas em revistas de surf da época (a Reef e a Surfing, que funda em 1964) e era dentro e fora de água presença notada e camarada da generalidade dos surfistas (como John Milius) distribuídos ao longo da Pacific Coast Highway. Coincidência ou talvez não é também o facto de Grannis – que começou a cavalgar ondas com 14 anos de idade – fazer-se acompanhar nos seus programas de surf e mais tarde também de fotografia de outros dois amigos, Lewis Swarts e John Ball, este último influência determinante pelo facto de fotografar desde cedo com caixas estanques que permitiam entrar no mar com as câmaras fotográficas, procedimento que Grannis usou mais tarde e mais comodamente com o recurso à máquina fotográfica anfíbia Calypso, criada por Jacques Cousteau, antes de progressivamente se deslocar para o uso de teleobjectivas que iam até 650mm e que permitiam “apanhar” os vagalhões de 6 metros de Waimea Bay e os heróis que neles se metiam (como Greg Noll e Gerry Lopez) com toda a segurança. O filme de John Milius dá igualmente conta da história de amizade entre três companheiros de ondas (o seu título em português é justamente Os Três Amigos), sendo que um deles se chamava LeRoy, não Grannis, mas “o masoquista” Smith. São pontos de contacto que poderão não querer dizer nada, pelo menos nada poderão significar de tão relevante como aquilo que aproxima filme e portefólio na capacidade de captar o espírito de um tempo de duas décadas e os vários elementos que integram a cultura do surf, como foi definida na primeira metade dos anos 60: a sua linguagem, a música que lhe servia de enquadramento (Beach Boys, Dick Dale, etc.), a arte, imprensa e moda da época.

[texto publicado originalmente na revista Atlântico, pelo qual não devo ter sido pago...]

Só entre muitos



Retirado do DVD de Marcelo Camelo para a MTV, filmado na Concha Acústica do Teatro Castro Alves em Salvador da Bahia. Espectáculo descontraído com banda numerosa, jazzística, onde se destaca o trompetista Rob Mazurek. Camelo a solo tem ainda repertório curto, e isso nota-se. Assim como se repara numa ou noutra desafinação que pode resultar da busca da estranha harmonia, ou mesmo de defeito de captação/mistura sonora (que sei eu...). Em complemento, mais para os namorados "out there", Janta. Marcelo olha enbevecido para a sua garota, mas não esquece a letra. E ela, Mallu Magalhães (n. 1novenovedois), também não.

Top 10

















A lista dos dez melhores filmes estreados que vi em 2011. Classificados de 0 (zero) a 5 (cinco), a que se juntam nanominimicro justificações.

1. Another Year, Um Ano Mais, de Mike Leigh (4/5) – Há quem diga que está bem.
2. The Next Three Days, 72 Horas, de Paul Haggis (3/5) – ... numa palavra: emoções.
3. Tulpan, de Sergei Dvortsevoy (3/5) – Pelo cântico das criaturas.
4. You Will Meet a Tall Dark Stranger, Vais Conhecer..., de Woody Allen (2/5) – W.A. em p.a.*
(* piloto automático)
5. Black Swan, Cisne Negro, de Darren Aronofsky (2/5) – P.a.** é o único modo de filmar de Aronofsky.
(** ver duas linhas acima)
6. Hereafter, Outra Vida, de Clint Eastwood (2/5) – Chega de encomendas.
7. Love and Other Drugs, O Amor é..., de Edward Zwick (2/5) – "Love means never having to say you're sorry." (Love Story, 1970).
8. Chloe, O Preço da Traição, de Atom Egoyan (1/5) – O futuro ruinoso.
9. The Fighter, Último Round, de David. O. Russell (1/5) – Peso pluma.
10. No Strings Attached, Sexo sem Compromisso, de Ivan Reitman (1/5) – Cisne branco.

Sem

2.11.2011

2.10.2011

Camisa 9 do Corinthians

Whorehouse Blues





Dedicado a todas as mulheres do planeta.

2.09.2011

Museu Lemmy a caminho


























O filme sobre Mr. Lemmy Kilmister que anda a ser mostrado em vários pontos dos Estados Unidos – à semelhança do que João Botelho vem fazendo com o Filme do Desassossego –, está disponível para compra no sítio da Amazon inglesa, no que é outra feliz coincidência do mercado globalizado. O documentário do ano passado dos "rookies" Greg Oliver e Wes Orshosky acompanha a vida do sexagenário (n. 1945) vocalista e baixista dos Motörhead, que é dos últimos exemplares fidedignos da vivência rock'n'roll personificada. É incrível que na sua idade Lemmy continue a gravar, a beber e em digressão como sempre fez. E com o aspecto físico que lhe conhecemos há décadas. Lemmy parece uma personagem conservada em "geekness". Descontados os apontamentos biográficos que se tornaram mitologia lemmyana (drogas, sexo e música), o que Lemmy traz de novo é o olhar debruçado sobre o quotidiano do músico recheado de idiossincrasias tão ou nada excêntricas como isso. A casa de Lemmy em Los Angeles, de que só viremos a conhecer o interior, está atafulhada de tralha de que Lemmy não sente necessidade de se separar: todo o material alusivo à sua imagem e à discografia dos Motörhead junto com peças que remetem para as duas Grandes Guerras (punhais, fardamento, réplicas, literatura vária) constituem aquilo que salta à vista, mas o aspecto interior da mansarda é qualquer coisa de caótico (típico abrigo de homem solteiro que tomou a balbúrdia por disciplina; ou então é mesmo a grande acumulação de objectos que não permite outra arrumação). Lemmy não é de todo dado à claustrofobia e segue o protagonista nas suas incursões diárias ao bar e restaurante Rainbow, de Sunset Blv., poiso célebre frequentado por músicos em todas as épocas. Lemmy vai lá porque gosta de se sentir rodeado daquela história que é também sua, mas sobretudo para ficar num canto agarrado à "slot machine" (dos seus menos difundidos vícios) e a beber Jack Daniels com Coca-Cola. No sentido prosaico, Lemmy faz parte da mobília do Rainbow: o escritório possível para alguém como ele que se orgulha de só fazer o que gosta. Também percebemos que este registo "access all areas" não foi sempre bem acolhido por Lemmy, facto que a dupla de realizadores faz questão de deixar evidente no "making-of" que é parte do segundo DVD. Lemmy (e Lemmy) não defrauda as expectativas dos fãs, sejam músicos ou público, mas existe nele o lado sentimental que se sobrepõe à mitologia quando fala do primeiro amor que perdeu para a heroína ou do único filho com que mantém contacto até hoje (os dois garantem ter já trocado de namoradas entre eles). A parte de Lemmy de que gostei mais é também comum a este tipo de proposta. Gosto muito dos depoimentos dos outros músicos sobre Lemmy (a lista é extensa e inclui Dave Grohl, Henry Rollins, Peter Hook, Alice Cooper, Ozzy, todos os elementos dos Metallica, Pepper Keenan, Jarvis Cocker e Ice-T). Nesses momentos é como se Lemmy se agigantasse na proporção em que aqueles que se lhe referem parecem baixar até nós e por um processo de empatia, pela paixão comum suscitada por figuras lendárias da música pesada. Quando Lemmy partir um dia (que ele parece eterno mas não é), o trabalho para a concretização do Museu Lemmy está quase pronto. É pespegar com a tralha em espaço visitável e colocar um tanque de guerra de tamanho real para receber os curiosos. Com estrondo.

Atrevam-se


2.08.2011

Menos que Proust














(...) A gente nunca aprende nada. O que o tempo e a vida fizeram foi permitir-me experimentar essas dificuldades e fazer-me reflectir sobre elas, senti-las na pele e tentar ultrapassá-las.
Não sente que sabe mais do que quando tinha 20 anos?
Talvez saiba mais mas não me aproveita. Não é por isso que deixo de sofrer as mesmas coisas que sofria quando tinha 25 ou 30 anos. Só que agora com cores e com uma espessura diferentes. Por detrás de cada situação dessas que vivo está a memória, outro tema importante para mim. Há uma memória de situações anteriores e portanto há uma tendência que eu neste momento consideraria ser para o desencanto.

[Pedro Tamen para Carlos Vaz Marques na Ler de Fevereiro.]


E assim a vida é: uma conferência com o tradutor de Proust ao final da tarde; um filme biográfico dos Motörhead depois do jantar. Assim a vida será, para depois ser a vida que foi. Já que não se aprende nada.

Desabafo


























Não lhe gabo o gosto nas fatiotas e então em matéria de automóveis pior é impossível (nada a ver com a cilindrada). Nada a ver com futebol. É fácil desmerecer do trabalho de Costinha, aliás como do de qualquer outro elemento do futebol do Sporting de há longo tempo a esta parte. Mas as suas declarações, ontem, parecem-me de enorme importância. Não me interessam as razões que o levaram a falar agora, nem vou perder tempo com conjecturas sobre a estratégia subjacente aos vários esclarecimentos. Nunca ninguém com a visibilidade de Costinha tinha falado assim, de forma tão escancarada, sobre o meu clube. De momento só as palavras dele interessam e o efeito que possam ter daqui para a frente:

Penso que os adeptos do Sporting separaram-se da equipa por causa da mentira, porque as coisas são sempre mal explicadas. Ninguém tem coragem, nem frontalidade para explicar uma série de situações. E quando isso acontece as pessoas tendem a afastar-se, porque nunca sabem o que é verdade ou mentira. (segue n'A Bola)

A chave é Russell Crowe














Não chega para fazer de Three Days Later/ 72 Horas um grande filme misógino (de-facto-não-é-misógino), mas é uma óptima cena de abertura. Dois irmãos, um dos quais o protagonista (John Brennan/ Russell Crowe), jantam com as respectivas esposas que encetam uma discussão sobre a natureza competitiva das mulheres, e de que elas deveriam ou não ter sempre homens como chefes ou subalternos, de modo a conter a rivalidade, sendo irrelevante a situação inversa: tomados os homens por mansos no universo profissional, seja entre eles ou com elas. Este momento é que não é irrelevante, uma vez que a mulher de John é levada pela polícia na manhã seguinte, acusada do homicídio da sua chefe. A condenação recai sobre prisão perpétua e a partir do veredicto o filme de Paul Haggis entra em modo Kramer vs. Kramer, sendo que no caso o abandono da mãe nada tem de voluntário.
Rumando ao principal mérito de Three Days Later/ 72 Horas, importa referir outra cena que decorre do facto de John, desesperado com o cada vez maior desespero da mulher, decidir sequestrá-la da prisão. Pesquisas na Internet levam-no ao encontro do homem que escrevera sobre sucessivas e bem sucedidas fugas da cadeia. Conclusão da conversa é de que não existem estabelecimentos invioláveis, o que é preciso é encontrar a "chave" para de lá nos evadirmos. O mesmo se aplica a esta realização de Paul Haggis (também autor do argumento que refaz um filme francês de 2008), o seu melhor trabalho atrás das câmeras: em minha opinião superior a Crash e superior a No Vale de Elah. Como manter a suspensão da descrença do espectador e fazê-lo torçer pelo herói desta proposta, um homem comum (professor de literatura num liceu), cujo amor pela mulher fará dele um pai ainda mais extremoso e ao mesmo tempo um criminoso disposto a tudo para ter a família de volta? A resposta é apenas esta: Russell Crowe, um actor igualmente convincente quando olha com paixão para a mulher (Lara/ Elizabeth Banks), e quando mais tarde se transforma numa máquina de agir. Crowe é magnífico (ponham os olhos nos olhos dele), e o seu próprio currículo cinematográfico, apesar de irregular, funciona muito em favor de 72 Horas. Poucos actores suportariam a alternância entre o sensível e vulnerável Dustin Hoffman do filme de Robert Benton (o tal! Kramer vs. Kramer), e uma figura com a fibra dos anti-heróis próprios ao cinema de Michael Mann.
72 Horas é também hábil na gestão da informação que passa para o espectador, determinante no nosso entendimento da inocência ou culpabilidade da mulher de John, e demonstra ainda notável virtuosismo na gestão do tempo, que acumulado se comprime até que sintamos a intensidade extrema do suspense, para de forma inesperada se distender (logo após o acidente na autoestrada) e libertar a carga existencialista deste filme de Haggis: como se não bastasse o incondicional voluntarismo do protagonista para que se atinja um final específico e desejado. A ilusão que surge do facto de sermos cúmplices dessa vontade irracional (como no exemplo do Quixote de Cervantes de que Paul fala aos seus alunos), é coisa de mansos e de românticos. Elas mandam na vida real, e a gente vira-se para as artes que sempre são mais eternas.

2.07.2011

The Arms Are Snakes
























O disco de uma banda de que tomamos conhecimento depois de extinta, pode ser escutado com a sensação de registo póstumo. É com este espírito que parto para Tail Swallower & Dove, o derradeiro These Arms Are Snakes (que capa fantástica).

Horizahmtal


















Lady Sarah Schofield.



















Lady Tara Jean.


Duas imagens de Olivier Zahm são suficientes para se encontrar um padrão.

True grit

2.04.2011

Gajos com guitarras



Always object. Never subject.

Patinho feio













Sai-se de Black Swan com a impressão que o melhor do filme passa por aquilo que não faz avançar em nada a narrativa: a partitura de Pyotr Ilyich Tchaikovsky (1840-1893) e os ensaios do bailado filmados com câmera à mão que nos colam aos corpos dos actores/bailarinos. No resto, Darren Aronofsky alinha umas citações trôpegas de David Cronenberg para significar o delírio da protagonista (a muito credível Natalie Portman), e encaminha-se para o laudatório final em modo auto-referencial que resulta apenas vazio e espectacular como no The Wrestler.
Correndo o risco de provocar os indefectíveis, remato com duas observações. Falta a Aronofsky alguma coisa que permita tratar os universos que filma (de modo vistoso e competente) com outra complexidade, a que não é alheio o olhar simplista sobre as personagens (sempre mais presentes por aquilo que exprimem visualmente que por algo que resulte de uma qualquer vibração interior). Se por esta altura o nome do realizador for proposto para a categoria de "patinho feio" de entre os novos consagrados do cinema norte-americano, o meu voto seguirá em espírito. Cinema não é feira ou circo.

2.03.2011

Estou muito aqui





















Isis e Neurosis, duas bandas que se confundem fonética e musicalmente.

Oeiras 2007






Eu não estava .

Rock in peace



















"The White Stripes do not belong to Meg and Jack anymore. The White Stripes belong
to you now
and you can do with it whatever you want. The beauty of art and music is
that it can last forever if people want it to. Thank you for sharing this experience. Your
involvement will never be lost on us and we are truly grateful."


2.01.2011

Espanta-espíritos



Para John Barry (1933-2011). Após o genérico o filme segue na versão dobrada em italiano. Apenas o genérico importa aqui e agora.

Música para acompanhar

Em sonhos


























Esta madrugada, de um sono pouco profundo, despertei enquanto fotografava Nina Becker. Passou tanto tempo desde a última vez que a vi que não consigo relacionar a visita. Quantas vezes terei sonhado com ela sem que depois me tivesse apercebido? Que relação terá o impulso dirigido a esta mulher com aquilo que vivi nesse dia? De qualquer forma estava a ser bom e são tão raras as memórias que os sonhos deixam no consciente. Regressa Nina, que temos trabalho para concluir. (fotos: Caroline)

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