The Tree of Life, obra de Terrence Malick distinguida faz dias em Cannes com o prémio máximo, enuncia desde logo o seu programa. Dar-nos a conhecer o "caminho da Natureza" e o "caminho da Graça", mostrando o que pode acontecer a quem escolhe o primeiro e a inevitabilidade de se escolher o segundo quando lidamos com a maior dor que a vida pode causar (a perda de um filho). Quando o filme se projecta na origem do mundo e no surgimento das suas espécies pré-históricas, o que está em jogo é o "caminho da Natureza": a lei do mais forte e o instinto de sobrevivência. Quando se projecta no futuro, oferecendo imagens para uma possível eternidade, é o destino final de quem aceita o "caminho da Graça" que se materializa à nossa frente: um cenário idílico de comunhão e harmonia entre todos os tempos e todos os homens.
A razão pela qual penso que The Tree of Life só em parte é conseguido, decorre do que senti como incapacidade para integrar o seu carácter projectivo (para tempos anteriores ou posteriores à existência das suas personagens) na história familiar que ocupa a maior parte do tempo do filme. Quando a forma é leve e Malick apanha a significação de cada instante que marca o afastamento dos rapazes da família O'Brien do seu pai, e a correspondente aproximação à figura beatífica da mãe, The Tree of Life consegue ser um pequeno filme atento e livre e com grande sensibilidade. A câmara de Malick mostra-se tão imprevisível como os movimentos das crianças e dos animais que brincam no seu mundo, que parece mais vasto do que aquele que o olhar alcança. Já quando o gesto é grandioso, quando a voz interior do Homem interpela o silêncio de Deus, e quando Malick representa o ser supremo pelo seu papel transformador na evolução do planeta, observável quer a nível microscópico quer no cosmos incomensurável, o projecto de Malick incorre num misticismo algo ingénuo e oco.
Mesmo reconhecendo a ambição e o desassombro do autor, não há como fugir à questão de que talvez não se possa ser igualmente impressionista em qualquer cenário e em todas as dimensões. Terrence Malick procura um grau semelhante de intimidade com os fenómenos humanos e naturais, como se decorressem ambos de uma lógica transcendente que os determina. Essa intimidade umas vez comove, outras aproxima-se de um virtuosismo vistoso e superficial. Malick não é Deus, mas parece querer medir forças com ele. Usar o cinema para revelar os seus caminhos misteriosos. Que serão todos: os da Graça e os da Natureza.