10.06.2009

O homem que amava as mulheres

















Truffaut na breve aparição hitchcockiana de O Homem que Amava as Mulheres.

Temos o cinema e temos a literatura. A paixão por ambos é grande em Truffaut. A pontos de se estabelecer a ocupação do tempo do filme ora pela acção (que traz sempre uma componente narrativa), ora pela narração (que apela à imaginação pelo menos que mostra). À medida que o livro de Bertrand Morane (Charles Denner, um quase sósia do nosso Tony de Matos) se torna no centro do filme, pelo modo como a história individual explica o comportamento compulsivo que o leva a "coleccionar" mulheres como a sua mãe coleccionava homens, o voz de Bertrand na sua evidência material remete o cinema para um plano segundo. A tentação do romanesco, de fazer passar muito tempo pelos sentimentos, implica em Truffaut um uso excessivo da palavra que descreve como descreve um romance. O cinema em O Homem que Amava as Mulheres/ L'Homme Qui Aimait les Femmes (1977) tem por função sublinhar em diferentes momentos a pulsão do desejo do protagonista, finalmente tão racional: a tentativa de reproduzir a mesma mulher (Véra/ Leslie Caron) em todas as outras. (Deus nos livre de igual suplício a que só a morte, como se verifica, pode pôr um fim.) Colocando-se quase sempre de fora das imagens dos seus filmes, François Truffaut consegue criar um clima angustiante até em situações burlescas. Naquilo que aproxima alguns dos seus títulos da obra de Woody Allen, não existe o corpo burlesco deste (a figuração do alter-ego) que sirva de válvula de escape. Daqui nenhum obsessivo sai vivo.

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