10.06.2009

David Sylvian e a música sem qualidades


























A parafernália de Keith Rowe durante as sessões vienenses de Manafon.

Dou o meu exemplo porque vim a crer que encerra maior universalidade do que inicialmente supunha. Quando adolescente eu gostava de ouvir uma música só minha, que os meus dois irmãos não apreciassem, e só mais tarde aprendi a partilhar. O prazer que a música proporciona tem sempre qualquer coisa de exclusivo. Ela pode servir-nos de companhia em momentos de isolamento e introspecção, e pode trazer-nos outras emoções quando partilhada: emoções que vêm da forma como percepcionamos nos outros o prazer que a música provoca. O novo disco de David Sylvian, Manafon, transcende esta dinâmica (solidão/partilha) na medida em que nasce da colaboração distanciada de um conjunto de músicos, cujas improvisações só verdadeiramente se encontraram na forma finalizada no estúdio onde Sylvian recompôs essas várias intervenções sonoras, juntando-lhes as suas palavras e a sua voz. Manafon será um trabalho colectivo composto de diferentes solidões, e nesse sentido apresenta a sua verdade descarnada, a carne pulsando de vida. É um disco que não ilude, o que não quer dizer que seja um trabalho desiludido (só é desiludido aquele que alimenta expectativas). Manafon alimenta-se dos seus muitos acidentes, e é para mim muito inspirador (ali onde junto as suas solidões à minha).

Arquivo do blogue