9.02.2008
The Host
É cada vez mais raro assistir-se a uma proposta cinematográfica que movendo-se no interior de um género com regras bem codificadas, consiga trazer à superfície a sensibilidade particular do seu autor. Nos últimos anos, à excepção deste The Host que motiva o post, só me lembro de alguns filmes de M. Night Shyamalan, sobretudo O Protegido que continua a ser o meu preferido. Voltando a The Host, que tive vontade de rever recentemente (e cada vez me convenço mais que os filmes que ficam são os que desejamos rever, ao contrário de outros que alimentam a memória reverencial que é mais mito que qualquer outra coisa), a impressão deixada é a de estar perante um objecto de grande originalidade e talento. O realizador coreano Bong Joon-ho sabe criar uma relação de facto física com as imagens do seu filme, e depois investe num tom de desconcertante auto-paródia que não compromete, antes intensifica, a espectacularidade do mesmo. Bong Joon-ho deve ser adepto do "complexo Fernando Mamede", já que a família de anti-heróis em combate com a viscosa criatura é constituída por um velho pai e três filhos falhados, cada qual à sua maneira: um sofre de ligeiro atraso mental, outro é bêbedo e está desempregado, finalmente a filha que parece ser daquelas atletas de quem embora muito se espere invariavelmente bloqueiam no momento da verdade. Isto são traços psicológicos que servem a acção e que o realizador não esgota no pressuposto de potenciar o efeito dramático. Aliás The Host é obra que se vê com relativo distanciamento, sem que isso belisque o nosso prazer intelectual e emocional. Bong Joon-ho estabelece uma progressão dramática que é da ordem do sonho, onde aquilo que acontece nunca surge quando esperamos que suceda, nem sucede de acordo com as expectativas que alimentamos com base em objectos que tenham afinidades com The Host: basicamente a história do cinema toda que envolva bicharocos nas suas variadas dimensões. E são pouco comuns os filmes que revelam coragem de apresentar como solução redentora a substituição de um filho biológico por outra criança que mostra traços mais óbvios e não menos pitorescos (comer e dormir, dormir e comer) de identificação com o "pai". A este título a cena final, passada à hora de jantar, é a meu ver memorável.
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