4.28.2010
Eugène Green, porque sim
O IndieLisboa mostrou em antestreia A Religiosa Portuguesa, de Eugène Green, produção maioritariamente nacional que reuniu apoios de França. Toda a acção do filme se passa em Lisboa, mostrada de início com a desarmante simplicidade de quem a descobre pela primeira vez. A Religiosa Portuguesa começa por ser isso mesmo: a descoberta da cidade conduzida pelos passos da protagonista, uma actriz francesa (Julie, Leonor Baldaque) que vem filmar a Lisboa A Religiosa Portuguesa: donde temos o "filme dentro do filme" com planos da equipa em cujos técnicos e realizador fazem deles próprios (com o pequeno aparte de Eugène Green responder no "filme dentro do filme" pelo nome de Denis Verde).
Ao olhar de Julie, que quando se lhe dirige traduz a perplexidade da busca do sentido para o amor na sua vida, sobrepõe-se o olhar omnipresente de Eugène Green que transmite uma delicadeza em tudo contrastante com as pequenas angústias da sua heroína. Os processos cinematográficos de Green voltam a dar prova de um autor que parece trilhar o caminho da refundação de um certo primitivismo do cinema. Os seus constantes grandes-planos, que pontuam os diálogos de acordo com a correspondência estricta entre frases e personagens, têm frequentemente a pureza expressiva do cinema mudo, e substituem a falsidade do naturalismo da ficção dominante por um anti-naturalismo fingido que partilha do registo burlesco no disfarçar da nobreza dos grandes sentimentos.
O amor e a sua correspondência directa com o conceito de Deus é o tema principal de A Religiosa Portuguesa. Num extenso diálogo próximo do final, quando Julie encontra a freira (Ana Moreira) que várias vezes vira rezar e que tanto a perturbara, esta fala-lhe de um amor uno na quantidade e de qualidade variável. Uma disponibilidade para esse sentimento que é uma e a mesma ao longo da nossa vida, e que oscila apenas em função daquilo para a qual é dirigida. A delicadeza do olhar de Eugène Green, que pode ser confundida com uma ingenuidade que choca com a rigidez atávica do espectador, parece ser também movida pelo amor. Há um lado afectuoso que ocupa todos os espaços de A Religiosa Portuguesa, que a espaços é também muito divertido.
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