10.23.2008
Tudo muito triste
Devo desde já dizer que pensava passar ao lado do filme W. de Oliver Stone, pela simples ordem dupla de razões. Primeiro, porque regra geral o cinema de Oliver Stone deixou de me entusiasmar. Depois, porque me parece de um grande oportunismo fazer sair W. num momento em que Bush se despede da presidência norte-americana, e em que muito do que se prende com a vontade universal de eleger Barack Obama para o lugar passa pela tentativa de colar John McCain à actual Administração. Dito isto, vou directo àquilo que motiva o meu maior entristecimento. Na edição desta semana da TimeOut faz-se um pró-e-contra em relação ao filme de Stone, que abre com este mimo: "É o filme por que toda a gente que odeia o presidente dos Estados Unidos da América, George W. Bush, (ou seja, 90% da população mundial) estava à espera. Mas... será que valeu a pena?". Será que o mundo está assim tão carregado de ódio (palavra fortíssima), ou isto não passa da pobreza jornalística que só vê indignação em tudo o que toca? Mais à frente, os dois críticos (o "a favor" e o "contra"), de uma forma menos tendenciosa, o primeiro, e mais primária, o segundo, parecem chegar à mesma conclusão: a de que os méritos ou debilidades do filme de Oliver Stone se medem na capacidade de este corresponder à expectativa dos que supostamente vilipendiam o Presidente dos Estados Unidos.
Palavras de André Santos: "Oliver Stone não tenta ser polémico em W.. Se motivos existem para tal, é por razões inesperadas: a visão neutra que pinta do actual presidente dos Estados Unidos. Diga-se que é neutro demais até, o que resulta numa imagem que favorece o presidente e pela qual não deixamos de sentir alguma simpatia e compreensão. " E palavras de João Miguel Tavares: "(...) toda a gente estaria à espera que o filme fosse a demonstração visual de uma verdade hoje em dia aceite (quase) universalmente, e que se pode resumir sem grande perda de rigor numa frase de quatro palavras: Bush é um idiota. Só que o Bush de W. não é um idiota e até tem – imagine-se – uma ou outra qualidade. Oliver Stone procurou uma abordagem subtil, senão mesmo justa, do mais odiado presidente americano de todos os tempos, e o resultado é um filme híbrido, que nem é carne nem peixe: demasiado sério para ser sarcástico; demasiado simplista para ser factual." E mais, do mesmo: "É triste, mas pelos vistos George W. Bush nem sequer para biopic serve." Pelo que se lê, dá a ideia de que 90% da humanidade tem uma ideia precisa de quem George W. Bush é, e sente-se na obrigação de rejeitar um retrato que não o trate como uma besta e um fracassado. E isto para não nos metermos por territórios do cinema e da sua linguagem e pela legitimidade de alguém, Oliver Stone, ou outro realizador qualquer, para apresentar a sua versão da mesma pessoa feita personagem. Confesso ainda que isto me dá vontade de ver W. o mais rápido possível e, digo mais, de gostar do filme em reacção ao que outros escreveram sobre ele. Não tenho pretensões de saber quem seja George W. Bush (além da impressão que tenho dele no desempenho das suas funções), e muito menos canalizo energias para odiar seja quem for.
Para uma visão mais justa, porque não recusa a complexidade da figura e do seu tratamento cinematográfico, sugiro a leitura de dois posts do João Lopes: aqui e aqui.
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