3.09.2011
Cerimónia
A partir do mínimo reconhecível de relevância, a produção e o consumo da música são actividades que implicam um propósito de afirmação. Podemos fazer ou escutar música para nos aproximarmos ou afastar dos outros. Podemos sentir idêntica necessidade de afirmação em diferentes fases da vida. Ao longo da mesma, com maior ou menor empenho, menor ou maior desespero, todos mantemos a vontade do amor recíproco, ainda que a mascaremos de muitos obstáculos e ilusões.
Os Swans "originais" eram a banda perfeita para os que gostavam de gostar de música de que poucos conseguiam gostar. Consigo identificar o sentimento porque tempos houve em que procurei este tipo de confronto e escolhi discos que, pensava eu, criavam uma barreira entre mim e o mundo (de gente frustrante e pouco confiável). Quando passei a encarar a música exclusivamente como forma de comunicar com outros a partir do sentimento já de empatia que procurei fosse sincero, aquelas bandas difíceis acabaram todas nas prateleiras de uma qualquer loja de discos em segunda mão. Alguns Swans tiveram este destino.
Passou meia década desde a edição do penúltimo álbum de estúdio da banda de Michael Gira, e os novos/velhos Swans surgem com um disco de título "smoguiano": My Father Will Guide Me Up a Rope to the Sky. Não me alongarei sobre um registo que percebe-se logo requer paciente digestão. Mas há sinais que saltam aos ouvidos, como a sofisticada construção dos ambientes sonoros sobre os quais se sobrepõe a batida marcial e apocalíptica de outrora, e também se isso for possível alguma serenidade na voz de pregador obscuro de Michael Gira: nunca assisti a um concerto dos Swans, mas vi Gira sozinho num palco e quando aquilo é para meter medo, mete mesmo medo.
Se os velhos/novos Swans se permitem ser amados de forma não tão tortuosa, e se a sua música actual irradia trevas junto com alguma pacificação ao avançar por territórios de negrume abstracto que podem sugerir passagens ou imagens de Cormac McCarthy, e talvez trocando exorcismo por resignação, é também possível da nossa parte retomar o caminho interrompido, recomeçando por este My Father Will Guide Me Up a Rope to the Sky. E degustá-lo com paciência e sem masoquismos.
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