3.13.2008

Mantenha-se atinto a Iosseliani

















Recordo o primeiro encontro com o cinema do georgiano Otar Iosseliani (n. 1934). Terá sido na primeira metade dos anos 90, era eu aluno da Escola de Cinema e seguia as sugestões dos professores com absoluta seriedade. Iosseliani, percebi anos depois, não era para levar a sério, tendo A Caça às Borboletas deixado uma marca de aborrecimento de que levei tempo a libertar-me. Entretanto, corajoso e curioso que sou, vi Brigands (salvo erro, na Cinemateca) e mais tarde Adeus, Terra Firme e Segunda de Manhã. Com a idade (e o vício) fui percebendo aquilo que constituía o gozo proporcionado pelos filmes de Iosseliani. Algo que tem a ver com o seu sentido de deriva idiossincrática, com o abraçar de um hedonismo que frustrará todo aquele, e apenas aquele, que pede aos filmes a gratificação imediata: algo a que todos temos direito mas que emprobecerá a nossa experiência de espectador. Devo confessar, a bem da honestidade desta sopa de letras, que Iosseliani, tomado pelo todo, ainda me impõe alguma resistência. Se a vontade de persistir for ainda maior, acredito que me estarão reservados vários motivos de prazer. De pura, extravagante e aristocrática rebeldia. Se há coisa além da história de que o cinema de Otar Iosseliani esteja tão ou mais cheio, é de vinho. As figuras dos seus filmes - tipos físicos muito particulares - bebem que se fartam. Bebem e despertam em lugares surpreendentes. No cinema de Iosseliani impera a geografia do sonho e do sono. Estamos no domínio do burlesco sonolento ébrio que substitui qualquer determinismo pela farsa. Por favor não tentem levá-lo a sério. Não se macem. Não se aborreçam. E bebam sempre outro copo: a Atalanta serve colheitas de 1999 e 2002, em DVD. Quem sabe a casa de cada um não seja o local perfeito para a partilha deste universo. Depende da garrafeira: a própria e a alheia.

Na imagem um instante do último filme de Otar Iosseliani, Jardins no Outono (2006). O realizador encontra-se no enfiamento do gargalo.

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