3.19.2008

Lovebirds














Grande parte das histórias que se contam em The Lovebirds deixam algo impresso na memória. O filme de Bruno de Almeida percebe-se que tem afinidades com algum cinema americano das décadas de 70 e 80 - o Scorsese "fora-de-horas", os mosaicos de Altman, a improvisação integrada por Cassevetes - e com o universo literário cheio de interseções poéticas, abstracções e metáforas, de Paul Auster. Mas Bruno de Almeida não incorre no provincianismo de filmar Lisboa como se fosse uma qualquer zona de Nova Iorque. Lisboa sente-se genuinamente neste The Lovebirds, o trabalho ficcional é plausível e por vezes comovente até. Acho que a montagem tem problemas que se notam sobretudo quando a alternância de situações dá a sensação de estarmos a assistir ao efeito de zappping. Esse desejo de aceleração vai-se perdendo e o filme acaba por saber demorar-se quando faz sentido: é bonita a conversa entre Fernando Lopes - de whisky numa mão e cigarro na outra - e o pugilista americano do filme dentro do filme (sobre boxe, cinema, derrota, sobrevivência), como também é encantador o despertar de Alfama por sobre o diálogo (a despedida?) do par formado por outro americano (Michael Imperioli), que vê uma mulher no Metro (a bela Ana Padrão; que decote, Deus meu!) e decide segui-la até ser dia... Outro episódio que não esqueço é aquele que revela a personagem talvez mais impressionante de The Lovebirds: o taxista interpretado por Dmitry Bogomolov que tem dentro de si o impulso de morte e de vida, que são como a noite e o seu fim, o dia e o seu começo, só que regidos por uma lógica animal, logo imprevisível. Como surpreendente é também a escolha de um muito particular fado de Camané para abrir para a manhã seguinte. É a única música intencional que se escuta no filme e também ela fica na memória.

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