3.07.2007

Estética











Não é fácil imaginar duas cinematografias mais distintas que as de Jacques Tati e Alfred Hitchcock. Ambos mestres do detalhe: Tati, em plano geral, Hitch, no grande plano. Analisar de seguida exemplos destes dois filmes - Playtime e Frenzy - permitiu-me ver ontem com clareza que quer o meu organismo, quer o meu intelecto, respondem diferentemente ao cinema de Hitchcock e Tati. Os filmes de Tati finalmente cansam-me; os de Hitchcock estimulam-me. Tati exige uma capacidade de concentração mais prolongada e obriga à orientação pelos seus labirintos burlescos. Hitchcock conduz-nos o olhar e leva muitas vezes ao encontro da sensação de prazer macabro, da fruição perversa de ordem mais visceral. Onde Tati é subtil (um radical da subltileza?), Hitch é radical (um radical tout court). Com Tati não conseguimos ver tudo. Com Hitchcock aquilo que vemos é tudo o que precisamos saber. Acho que vejo sempre e só Tati nos filmes deste (no duplo sentido), e que me revejo nas obras de Hitchcock (em múltiplos sentidos). Acho finalmente que o prazer que sentimos no cinema é principalmente de ordem narcísica. A estética formatada pelo umbigo. Mas gostar de um destes realizadores não implica apreciar menos o outro. A cada umbigo, evidentemente, a sua estética.

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