11.27.2012

Vai e vem




















Danação (1988) é daqueles objectos para deixar parva a alma. Começa com a imagem de um teleférico que se desloca em movimento circular longilíneo, que vai e volta, transportando carvão. A derradeira cena mostra um homem quebrado em confronto com um cão, a ver quem afugenta o outro com o seu ladrar. Há muitos cães e muita música neste filme de Béla Tarr, hipnótico e filosófico, com um enredo que quase não se intromete na fruição nossa existencialista.
Impecável e decadentemente coreografado, dá a sensação de que Tarr comunica com o trabalho de Pina Bausch, da altura ou por vir. Danação é ao mesmo tempo valsa inebriante e triste, não propriamente desesperada, antes resignada com o absurdo da vida. Nota-se ainda a adoração que Tarr nutre pelo cinema de Andrei Tarkovsky, mas o que testemunhamos é da ordem do encontro de inteligências ímpares.
Mesmo visto no ecrã do televisor dá para sentir a carga plástica, os cenários desoladores que são expressão de existências sem sentido, a chuva que não pára de cair e que empurra as personagens para a clausura dos espaços onde uns dançam e outros bebem. Muita bebida, longas conversas poéticas que se modelam nos sons e nas imagens num todo abstracto. E porque é que isto é tão bom? Béla Tarr é um mestre coreógrafo que parte da fisicalidade dos elementos (use-se a expressão fisicalidade com propriedade que não é de todos) para dar a sentir o movimento interior do mundo. Uma ordem universal e antiga que governa aquilo que somos. Vamos e vimos sem resultado algum, perpetuando essa determinação que nos ultrapassa.


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