8.22.2012

777 o número da besta sobre carris





















Unstoppable/ Imparável (2010) tornou-se em definitivo o último filme de Tony Scott. Um tipo sente-se mal se por qualquer imperativo pressiona o botão de pausa no comando (virtualidades do consumo caseiro de filmes), invalidando a ameaça que Tony Scott põe em marcha na forma de um comboio desgovernado, o 777, comboio também "fantasma" porque ninguém vai nos comandos e não tem passageiros, que transporta material tóxico e altamente inflamável, lançando o pânico nas povoações da Pensilvânia no seu caminho, até ao trágico destino final marcado para Stanton, a vila de um dos indivíduos que tentará travá-lo com o risco da própria vida.
Imparável conta uma história de redenção e logo passarei a explicar por quê. Foi também a derradeira colaboração (de várias) entre Tony Scott e Denzel Washington (“once you go black you never come back”), um pouco como na aliança que estabeleceram John Ford e John Wayne, projecções um do outro, e peço-vos o carinho de considerarem que Tony Scott possa ter sido o John Ford da geração dos gadgets. Denzel personifica de novo a tarimba e o pragmatismo americanos e dá o rosto dominante a um episódio que se baseia em acontecimentos reais.
A direcção de Tony Scott cede um pouco no habitual barroquismo da montagem, para servir a história do nascimento da amizade "sob pressão" entre dois homens, o experiente condutor de locomotivas e o rookie (interpretado pelo absolutamente neutro Chris Pike) que trocam dissabores sucedidos com as suas vidas familiares, enquanto procuram “salvar a humanidade”. O mais velho negligenciara as filhas após a morte da mulher por doença. O mais jovem acusara a mãe do seu filho de uma infidelidade que se veio a provar falsa.
Há medida que a imobilização do comboio se transforma num evento nacional, com cobertura e interpretação televisivas a cada instante, a questão passa a ser a de eles terem hipótese de recuperar um amor que não souberam valorizar, redimindo-se perante o olhar do país que só interessa pelo grau de espectacularidade, porque à escala intimista este filme trata apenas daqueles dois condutores de caminhos-de-ferro e das mulheres que trataram mal.
De caminho Tony Scott coloca em definitivo a obra pioneira dos irmãos Lumière na categoria de atracção de feira (mera hipótese académica), homenageando-a ao mesmo tempo que diz: é sempre a mesma história, apenas se alteram a escala e a perícia técnica.
Está-se a falar, recordo, para a geração gadgets.

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