11.28.2008
Eterno retorno
Devo agradecer a David Sylvian o facto de me ter apresentado à música (e aos sons, em pormenor) de Christian Fennesz quando eu possuía já um disco dele: Endless Summer. Descobri-o por alturas do encontro com outro álbum extremamente decisivo na formação do meu gosto pelo ambientalismo electrónico, que foi Radio Amor de Tim Hecker, que igualmente participava do espírito de intemporalidade das memórias de Verão de contornos mais ou menos definidos, traçadas a drones e glitches. Em todo o caso, o que veio a encurralar a minha atenção foi a base instrumental de A Fire in the Forest que encerrava o tremendo Blemish de Sylvian. O disco, todo em intimidade e auto-reflexão estendia-se ao formato de cinemascope por obra das abstracções sonoras de Fennesz e dos crescendos de que o músico ainda hoje não abdica. Também por isto, o novo Black Sea é não menos arrebatador, e à falta de palavras diferentes que traduzam o contínuo da discografia do austríaco, sobretudo dos três últimos CD's em nome próprio que no meio situam Venice (onde David Sylvian retribui a colaboração), volte-se a afirmar o carácter de espectralidade dos sons - guitarras dedilhadas, percutidas ou processadas, densos ou vaporosos mantos de electrónica, incidentes de uma geografia pessoal que volta a caminhar para o mar. Fennesz partilha do impulso romântico de procurar reproduzir sentimentos primordiais, que à força de serem continuamente reprocessados, vêm a tornar-se uma espécie de miragem. Isto é o melhor que se pode atingir, pois sabem os românticos avisados que só o simulacro é recuperável, o facto em si é um mito que cultivamos ao traçarmos em mito a nossa própria história.
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